PMDB: partido de programa por Antonio Risério
Este é o título de um artigo do jornalista Fernando de Barros e Silva, publicado no jornal Folha de S. Paulo, que só agora li – para variar, com certo atraso: vou empilhando textos e livros que acho que preciso ler, mas o dia só tem 24 horas, de modo que ando sempre meio atrasado. Em todo caso, vou lendo e examinando o que é possível. E esse pequeno artigo do Fernando de Barros e Silva, cujo título é de dar inveja, merece destaque.
É claro, lúcido e
vai direto ao
assunto, botando o dedo na ferida.
Barros e Silva comenta o fato
de que o
PMDB resolveu elaborar um "programa de governo" para contrabalançar o
programa
que o PT apresentou, ao lançar a candidatura de Dilma Rousseff ao
Planalto. "O
PMDB resolveu pensar.
Eis aí uma notícia: o partido que se
confunde com a
política do pragmatismo cego está disposto a apresentar sua visão sobre o
futuro
do Brasil. A legenda que virou sinônimo de oportunismo e fisiologia no
país
teria percebido agora que lhe falta um lastro (ou lustro) doutrinário.
Ora, o
PMDB não precisa de um programa de governo, mas de um manual de conduta"
–
afirma, de cara e com absoluta precisão, o jornalista.
Acrescentando:
"A
escassez de ideias, de bandeiras e de lideranças não é, no caso do PMDB,
um
problema, mas a condição para que ele seja o que é". Claro. Partidos
como o PT
ou o PCdoB mantêm unidos seus quadros díspares em torno de um ideário
comum,
mesmo que vago, de socialismo. Mas o PMDB se guia, única e
exclusivamente, por
cargos e verbas. O "ideal" que une o partido é ter suas raposas nos mais
diversos galinheiros. Ora, um partido assim não pode ter um pensamento,
um
ideário, um programa. Se quiser determinar um, explode em cacos para
todos os
lados. Ninguém ali está interessado em teses ou compromissos nacionais,
mas em
garantir sua fatia no bolo.
É assim que o partido se comporta
internamente.
É assim que conversa com outros partidos e
políticos que
quer trazer para o seu jogo. É assim que se conduz diante da mídia,
tentando
cooptar, a qualquer preço, quem dispõe de meios para se dirigir ao
grande
público. Vejam os exemplos disponíveis aí na Bahia. Já diante de quem
está no
poder, a moeda de troca do PMDB é poderosa: o número de quadros de que
dispõe em
câmaras, assembleias e no Congresso, garantia de "governabilidade".
E
esta é a base da podridão do atual sistema político brasileiro.
Diante
do
eleitorado, claro, encenando o teatro mais sujo da política, o partido
faz de
conta que é partido – vestindo a capa e afivelando a máscara da defesa
dos
interesses nacionais e das aspirações populares. Quem quiser que conte
outra…
As reais motivações do partido estão anos-luz distantes de qualquer
coisa que se
pareça com interesse nacional ou desejos e necessidades da
população.
Mas, para encenar a farsa, fazer seu próprio teatro do
absurdo, o partido precisa de alguma ferramenta. Daí essa história de
fazer um
programa de governo. Sem quadros capazes de elaborar qualquer coisa algo
consistente, todavia, o PMDB se viu obrigado ao vexame de terceirizar a
formulação do "seu" programa.
Ainda Barros e Silva: "Como o
partido, à
medida que engordou, perdeu sua massa crítica (e encefálica), teve que
recorrer
a um serviço de ‘sábios delivery’ para pensar o país.
E nada
sintetiza
melhor o fundo farsesco desse esforço programático do que a presença de
Roberto
Mangabeira Unger entre os neopeemedebistas pensantes. Mangabeira –
diga-se logo
– é um intelectual de grande envergadura, criado no ambiente da esquerda
liberal
norte-americana. Mas suas ideias, embora originais, foram sendo tragadas
pelo
ridículo de suas incursões desastradas na vida política – uma mistura de
voluntarismo ingênuo com oportunismo feroz".
É com tristeza que
tenho de
concordar. Conheci, fascinado, as ideias originais de Mangabeira para o
Brasil e
o mundo. É um pensador respeitado internacionalmente. Mas sua prática
política é
um desastre. E Mangabeira virou então esse misto estapafúrdio de motivo
de
orgulho intelectual para todos nós – e motivo de vergonha política,
também para
todos nós. Ele também quer o poder pelo poder, ainda que não para encher
o bolso
de dinheiro. Mas virou mero anão amador, usado pelos altos profissionais
do
partido de programa.