Aldeia Nagô
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Pra não dizer que não falei das bandas. Por Paulo Cabral Tavares

2 - 3 minutos de leituraModo Leitura
Paulo_Cabral_Tavares

Sugiro a todos que leiam os artigos sobre Chico na Veja da última semana. Deixo claro que a sugestão é uma forma de compartilhamento de uma boa leitura sobre o maior letrista da música popular brasileira vivo.

Num dos artigos, o filho de Elis Regina e Ronaldo Bôscoli diz que seu pai sempre lhe dizia que Chico era deus. Assim mesmo em letra minúscula para não ferir as suscetibilidades dos muito religiosos. 

Para mim, Chico sempre foi deus. 

Desde quando ouvi pela primeira vez “A Banda” num “Festival da Canção”. Aparentemente despretensiosa, levou o primeiro lugar e um generoso prêmio em dinheiro. E Chico se recusou a receber o prêmio sozinho, impondo que também fosse premiada em primeiro lugar “Cavalgada” de Geraldo Vandré. E, em consequência, o prêmio em dinheiro foi dividido pelos dois. Aí ele começou a ser deus.

Eu não consigo ver uma banda passar, “cantando coisas de amor” sem me emocionar. Mas emocionar mesmo. De dar nó na garganta e segurar uma lágrima no olhar. No meu tempo de menino, as Bandas, as “filarmônicas”, as “Euterpes” da época, correspondiam aos conjuntos musicais de hoje. Sempre “abrilhantavam” as festas de nossos padroeiros. Que saudades Mestre Lôla, de sua XV DE MAIO e de seus pupilos envergando orgulhosamente seus uniformes brancos com botões dourados de marinheiro a desfilar garbosamente pelas ruas de Ipiaú, por Ubatã e por tantas outras cidades. Meninos humildes mas quando desfilavam por nossas, pareciam reis com seus instrumentos e suas maravilhosas vestimentas. Um dia eu escrevi:
“…e quando for de manhãzinha,
Bem na fumaça do gongo..,
Eu chamo Ari e mamãe 
Pra irmos pra procissão 
Da festa da padroeira.
Vou ficar junto da banda
Juntinho do contrabaixo,
Marcando no seu compasso, 
Meu compasso de emoção…”

Outro dia eu ia passando de carro, com destino ao meu escritório e vinha em sentido contrário uma fanfarra, me emocionando com os seus instrumentos de sopro. Aí eu pedi ao instrutor surpreso, que parasse um pouco a caminhada e que, somente por alguns momentos, a fanfarra tocasse para mim. Ele parou e os meninos tocaram uma daquelas músicas especiais que às vezes as fanfarras tocam. Qualquer música, qualquer fanfarra, qualquer banda, em qualquer lugar, basta que elas existam e que eu assista a sua passagem com seus maravilhosos sons, para me emocionar.

E, naquela pausa da correria diária, eu fiquei ali dentro do carro, emocionado, ouvindo a banda cantando coisas de amor. E, de repente, parece que se abriu um portal diferente e me transportou para outro lugar, para outra dimensão, para um outro mundo, porque eu me esqueci de tudo, do que ia fazer, da vida, e, segurando uma lágrima, vivi um bonito momento de emoção. Prosaicamente. No meio da rua, dentro do meu carro, sozinho, mas vivendo um turbilhão de sentimentos.

Eu ia escrever sobre Chico. Mas vou ficar por aqui. Já me emocionei muito registrando aquele momento maravilhoso. 
Vou ficar esperando que outras bandas passem, para que eu possa parar, ouvir e me emocionar novamente.” 

Ubatã, 30 de agosto de 2017.
Paulo Cabral Tavares é pai da atriz Analu Tavares.

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