Aldeia Nagô
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Radicalismo e desenvolvimento por Ubiratan Castro

3 - 4 minutos de leituraModo Leitura

Nos idos tempos de minha juventude, o radicalismo político era
indiscutivelmente vermelho, nas suas várias tonalidades; do rubro encarnado do
livrinho de pensamentos do presidente Mao até o rosa choque da
social-democracia. As velhas tias baianas desenvolveram uma sábia teoria, pela
qual comunismo era como surto de sarampo.


Era normal na infância e muito
perigoso na maturidade! Hoje, o radicalismo mudou de cor. Ele é
indiscutivelmente verde, em todas as suas tonalidades; do verde-oliva dos
defensores da floresta, ao verde-musgo dos defensores das águas, até o verde
claro dos defensores do ar puro e do clima fresco.

Para que meus amigos
verdes não fiquem verdes de raiva, devemos reconhecer que o radicalismo é da
natureza dos movimentos sociais. Cada movimento existe em função de uma pauta
específica, focada em uma questão que assegura a legitimidade e a militância de
todos os seus simpatizantes. Por isso os movimentos sociais são sempre
maximalistas.

Assim é que os governos são de partidos políticos e não de
movimentos sociais.

O mais grave é que os radicalismos nunca andam sós.
Ao lado do verde infantil, anda o saudosismo senil. Nós todos, pós-sexagenários,
sentimos bater em nossas mentes a saudade de nossa própria juventude. "No meu
tempo tudo era melhor". Ai que saudade tenho da Estância Hidromineral de Dias
D‘Ávila, veraneio de toda a minha infância.

Nunca mais os banhos das
milagrosas lamas preta e branca, nunca mais a cata de mangaba nos tabuleiros…
ai que saudade! Mas nem por isso pretendo destruir o Polo Petroquímico,
principal atividade industrial da Bahia. Esta patologia tem hoje um sintoma: a
saudade da Itaparica do meu avô! Como diz o povo, amor que fica é amor de
Itaparica! A mais recente manifestação deste encontro de radicalismos é a
oposição apaixonada ao projeto de construção da ponte SalvadorItaparica. Este
não é um projeto rodoviário isolado. Ele faz parte de todo um planejamento do
Estado da Bahia para a reativação da Baía de Todos-os-Santos e seu entorno, o
Recôncavo Baiano. Esta baía nunca foi um local bucólico de contemplação e sim um
local de trabalho produtivo! O desafio do presente é a restauração do
desenvolvimento articulado de toda a baía, com indústria naval, interligação de
estradas com o sistema de portos e expansão da indústria automobilística e do
Polo Petroquímico.

A baía bucólica é o triste resultado das mudanças
econômicas dos anos 60, com o funcionamento da Rio-Bahia e com a implantação da
economia do petróleo, que produziram um Recôncavo desenvolvido, chamado Região
Metropolitana de Salvador, e um Recôncavo abandonado, chamado de Histórico.
Nestes espaços abandonados, ficou uma população pobre, os nativos, sem acesso
aos serviços de saúde, educação, sem emprego e sem rendas, indigentes das
migalhas dos ricos veranistas e turistas do Recôncavo desenvolvido que, durante
algumas semanas no ano, iam descansar as vistas com a pobreza alheia. Na baía do
século XXI, tanto nativos quanto veranistas têm o mesmo direito de acesso aos
benefícios do desenvolvimento, pois são todos cidadãos baianos.

O grande
remédio contra os radicalismos é a prática da democracia. Que todos os
interessados sejam ouvidos! Que se defina a justa medida da preservação da
cidade de Itaparica, cidade histórica e estância hidromineral, de modo a
protegê-la dos impactos negativos da desfiguração urbana e da implacável
especulação imobiliária. Queremos todos que a cidade de Itaparica continue a
produzir milagres com a sua "água fina, que faz velha virar
menina".

Ubiratan Castro de
Araújo Integrante da Academia de Letras da Bahia e diretor-geral da Fundação
Pedro Calmon/SEC

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