Se autocrítica ganhasse eleições a direita não teria 1% dos votos, por Rogério Maestri
No momento da derrota esperada da esquerda vão surgir várias autocríticas sobre a divisão da esquerda ou o que teria de ser feito e não ocorreu.
A lógica dos fatos foi inexorável, a esquerda seguindo os passos da direita procurou o máximo possível se municiar de recursos pelos mesmos meios que a direita se municia para fazer um combate de igual para igual com as mesmas armas que durante séculos a direita burguesa se utilizou.
Não sabem os estrategistas que quando se tem uma guerra assimétrica não se devem aceitar as mesmas armas e as mesmas estratégias que quem tem maior potência de fogo se utiliza.
O PT conseguiu o governo lutando de bodoque contra fuzis, mas como a situação política era extremamente favorável às forças de oposição o bodoque superou o fuzil. Porém, como viram que não podiam continuar lutando de bodoque procuraram comprar fuzis de segunda mão e num número bem menor de armamentos e com fontes finitas de suprimentos contra um inimigo com possibilidades quase infinitas se partiu para o combate. Deu no que deu, não foram os erros nem os acertos que derrubaram a esquerda brasileira nesta eleição, foi simplesmente à lógica do combate que levou a derrota.
A esquerda deve ter consciência que nunca pode aceitar as mesmas regras para combater o inimigo, e que não são nos momentos de crise que devem ser redefinidas as posições e alianças.
Se a esquerda está dividida neste momento, não é nada de notável e inédito, sempre a esquerda está dividida da mesma forma que a direita também está dividida, logo frentes ou ações conjuntas que não sejam para lutar contra o arbítrio e a violação dos direitos individuais, devem ser feitas.
Ficarmos em autocríticas intermináveis estabelecendo quem é culpado do que é um imenso desgaste e não serve para nada, partidos conservadores jamais fazem autocríticas privadas ou ainda mais públicas, e se a forças progressistas querem crescer de novo devem aparecer cada um com a sua cara para não perder o que se tem de mais valioso, a diversidade.
O povo brasileiro mais uma vez foi enganado com o discurso da moralidade que foi muitas vezes empregado ad nauseam por amplos setores das forças progressistas, principalmente aqueles setores de origem pequena burguesa. Estes setores tomaram o mesmo veneno que foi utilizado na luta contra a reação e em nenhum momento se contestou quando se preparava as táticas que permitiram a reação, por que se veio adotar as mesmas armas da direita conservadora.
Os governos progressistas não entenderam o seguinte, se a base operária de alguns partidos não permitiu que a suas lideranças os traíssem, não adianta tentar passar por alguém que é aceito no banquete do poder, pois por mais que apreendam regras de etiqueta, jamais manejarão o garfo e a faca com a mesma destreza de quem apreendeu desde a infância.
A situação normal da política brasileira é que a cada quinze ou vinte anos abre-se uma pequena janela que permite à proximidade de setores progressistas a parte do poder. Porém esta parte do poder não é total e o que resta serve para rebaixar o status de comensal do banquete a serviçal do mesmo.
Quando esta janela se abre, as forças progressistas devem tentar desnudar por completo o sistema de poder e não compartilhar com o mesmo parte dele pensando que isto será eterno.
O povo brasileiro tem a perfeita noção do que é a justiça, do que é a polícia e do que são os empresários, ao verem na mesma mesa seus representantes, tentando comer com a mesma precisão cirúrgica com que a burguesia manuseia os talheres, sente-se alijado do poder. Se um movimento progressista de esquerda assume uma parte do poder, deve e tem obrigação de questionar o resto e não compartilhar da mesma mesa, tanto em sentido figurado como em sentido literal.
Emprega-se muito a expressão “Para a mulher de Cesar não basta ser honesta, ela tem que parecer honesta”. As forças de esquerda além de ter que ser honesta, coisa que há também fortes derrapadas, tem que parecer honesta para sua base. Compartilhar o poder com seus iguais é uma coisa, com pessoas totalmente diferentes não os torna diferentes para as bases, mas sim para os outros comensais, esses sim percebem as sutilezas e nunca aceitarão a mesa.
Logo, não é momento de autocrítica ou de frentes, é o momento de seguir em frente com os recursos e com a desunião que sempre existiu, para quando abrir outra janela estejamos pronto para aí reavaliar as estratégias.
Artigo publicado originalmente em http://jornalggn.com.br/blog/rdmaestri/se-autocritica-ganhasse-eleicoes-a-direita-nao-teria-1-dos-votos-por-rogerio-maestri