Aldeia Nagô
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Um e-mail para a humanidade por Antonio Godi

4 - 5 minutos de leituraModo Leitura

Aqui digita um cidadão esperançoso
com a luta do homem. Uma conquista da pluralidade no coração perverso do
capitalismo. Conquista desvelada pela diversidade do que somos através da
legítima eleição de um afro-americano, enquanto presidente da nação mais
poderosa dos últimos séculos.






Chama a atenção o fato do mesmo, Obama,
considerar o Presidente brasileiro como "o cara". Entendo que o "cara" é o
homem que queremos construir. Mais ainda, que ao colocar nosso presidente como
o "político mais popular da Terra". Revela na sua espontaneidade a qualidade e
a quantidade da "polis" no ponto G-20 dos contatos dos humanos em busca da
convivência fraterna. Parece ser um sinal dos tempos. A conquista muitas vezes
dolorosa mas também alegre e estética de uma corajosa geração de mártires.

Militantes e mártires
transnacionais que deram suas vidas por um mundo mais igual e fraterno.
Lutadores da construção de uma existência generosa apontando para uma
humanidade sem parâmetros de diferenças. O novo contexto que herdamos deve
homenagens a todos eles e elas que apostaram suas vidas na construção de uma
nova existência humana. É preciso entender que o sacrifício da vida e da morte
é um empreendimento político de nossos mártires que gritam pelo reconhecimento
e legitimidade do que somos.

Mártires como Jónatas da
Conceição, poeta, militante e visionário da construção do homem. Jónatas,
acredito, viajou convicto do dever cumprido em 4 de abril de 2009. Quem sabe em
poltrona próxima do meu irmão e humanista Geir Espinheira. As passagens
gloriosas de nossos mártires não são oferecidas nos balcões de agencias de
vendas. Até porque apontam para destinações para além de tempos e lugares. O
destino é o enigma do devir humano. Jónatas e Geir foram na direção de nós. Sei
que sempre os encontrarei nos compartimentos de minha humilde biblioteca. Ou em
espaços recônditos de nossas memórias tantas. Juntos, estaremos com mártires e
irmãos diversos que apostaram na igualdade das aspirações humanas. Seguramente
o encontrarei no "Orúm": lugar para além do aqui e agora. Lá estaremos
celebrando as conquistas de uma geração vitoriosa.

Para os nagôs a morte é
reverenciada na cerimônia sagrada do axexé
através de um ritual marcado por uma marcha itinerante de ir e vir. Passos para
frente, passos para trás em uma coreografia enigmática que parece dar conta da
consciência e ensaio do devir a ser construído. Durante o enterro de Jónatas o
ocaso se configurou diante de mim com o pôr do sol e um inusitado quase imperceptível
arco-íris no horizonte. Uma configuração entre o Ilê (terra) e o alá (céu). A
terra dos viventes presenciais e do "orúm" sacralizado para além de todos nós.
Estava então diante de Oxumaré a cobra do arco-íris dos povos fon e jêje. Lá
estava eu num ritual de ida e vinda emocionado por ser filho de Obalwayiê, o
Rei dos mistérios da terra.

Aqui estou de bem com a luta da
vida e de mal com a morte que perpetua a luta sagrada pela existência. Aqui
aqueço minhas lembranças através de nossos mártires: M. L. King, Malcon X, F.
Fannon, M. Garvey, E. Cleaver, B. Marley, P. Tosh, B. Seele, J. Brown, A.
Cesaire, S. Byko, etc. Por aqui e sempre Popó do Ilê, Lino, Roberto e Manoel de
Almeidas, Luís Orlando e Ythamar Tropicália. Todos flanando orgulhosamente em
alamedas universais. Sem esquecer, Mário Gusmão grande nos dramas de nossa
cultura. Hoje, heróis vestidos em ternos sagrados de pinhos. Enterrados fisicamente
e tão vivos. Imagino, que eles hoje fazem tremer a terra úmida que nos abriga. Certos
que no sepulcro como na vida multiplicamos frutos e revoluções culturais.

Acredito que todos estão a se
mexer em seus ternos de pinhos. Madeiras anunciadoras do que sempre oferecem:
folhas, flores e frutos. Madeiras tantas que gritam por continuar nos
oferecendo oxigênio e vida através do mistério da fotossíntese. Folhas tantas
que denunciam as mortes de nossas florestas sagradas. Tão raras e caras para o
futuro de nossos rebentos. Como o jardim das folhas sagradas que polariza, a vida
e a morte escoando em ribeirinhos, rios e mares gritando por vidas e
sobrevidas.

Antonio Jorge Victor dos Santos Godi
Antropólogo, ator e professor da
UEFS/NUC/DCHF
E-mail: antoniojorgegodi@gmail.com

 

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