Aldeia Nagô
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Uma situação boa demais para o governo por Maria Inês Nassif

5 - 7 minutos de leituraModo Leitura

A geração dos brasileiros que eram adultos no final da ditadura militar (1964-1985), nela incluídos o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso (PSDB), o ex-governador José Serra (PSDB), a ex-ministra Dilma Rousseff (PT) e a ex-ministra Marina da Silva, não presenciou um momento como esse antes e dificilmente viverá um outro. Não vai dar tempo de assistir uma reedição desse período, o único da história do país com alta taxa de crescimento econômico e democracia. Daí a dificuldade da oposição de alinhavar um discurso que seja consistente para ganhar o apoio de um eleitorado majoritariamente governista, satisfeito com a vida que tem e que acha que a sua vida vai melhorar com a continuidade, e não com a mudança.


O
crescimento do Produto Interno Bruto (PIB) no primeiro trimestre do ano
de 2010,
comparado com igual período do ano passado, foi de 9%, segundo foi
anunciado
essa semana. No artigo "Eleições presidenciais 2010: ruptura ou
consolidação do
pacto social", publicado pela revista "Em Debate" da UFMG, o cientista
político
Ricardo Guedes Ferreira Pinto, do instituto de pesquisas Sensus, lembra
que, de
2002, último ano do governo de Fernando Henrique Cardoso (FHC), até
agora, as
reservas internacionais pularam de US$ 35 bilhões para US$ 240 bilhões; o
salário mínimo, de US$ 80 para US$ 280; o índice Gini caiu de 0,58 para
0,52
(quando mais próximo de zero, maior a igualdade); 30 milhões de pessoas
das
classes mais pobres ascenderam à classe média; 10,6 milhões mudaram de
favelas.
O PIB saiu de um patamar de US$ 500 bilhões para US$ 1,5 trilhão. Há uma
forte
identificação desses dados sociais e econômicos positivos com o governo
Lula.
Diz Guedes, citando pesquisa Sensus de maio, que 57% dos brasileiros
acham que
esses benefícios foram gerados pelo governo petista e apenas 17%
consideram que
eles vêm do governo de Fernando Henrique Cardoso.

Um candidato
oposicionista terá grande dificuldade de abalar essa convicção sobre o
governo
Lula que está tão alicerçada na opinião pública. José Serra (PSDB)
poderia
tentar isso pelo convencimento de que tem maior capacidade do que a
escolhida de
Lula para aprofundar as conquistas do atual presidente. Segundo a
pesquisa
Sensus, essa já é a opinião de 26% dos entrevistados. A outra
alternativa do
candidato de oposição seria a desqualificação pura e simples da sua
adversária.
É um caminho que pode parecer mais fácil do ponto de vista retórico, mas
com
grandes chances de fracassar, diante dos índices de popularidade do
governo.

As pesquisas
indicam que 2010 começa sob o signo do governismo. As séries históricas
das
pesquisas reiteram que esse é um período histórico singular. Segundo a
CNT-Sensus, de 1998 até 2002, o governo Fernando Henrique manteve uma
avaliação
positiva nunca maior do que 32% (em dezembro de 1998). A menor foi de
8%, em
setembro de 1999, repetida em outubro daquele ano. A menor avaliação
positiva do
governo Lula foi de 31,1%, em novembro de 2005, no auge do chamado
escândalo do
mensalão. Segundo a pesquisa de maio de 2010, a oposição lida com uma
avaliação
positiva do governo Lula da ordem de 76,1% .

O CNT-Sensus
passou a apurar separadamente o desempenho do presidente da República e o
do
governo a partir de 2001. FHC alcançou seu maior índice de aprovação em
abril de
2001, de 46,1%. O pior desempenho de Lula foi de 46,7%, atingido em
novembro de
2005. Em maio de 2010, Lula tinha a aprovação de 83,7% dos
entrevistados.

Em 1996, uma
pesquisa Ibope encomendada pelo Palácio do Planalto foi noticiada pela
revista
"Veja". Comparava o desempenho de todos os presidentes da República
pós-redemocratização no final do primeiro ano de mandato. FHC tinha 43% e
era o
campeão, segundo a revista: Sarney teve 36%, Collor, 30% e Itamar, 13%,
na soma
das avaliações ótima e boa. Sarney chegou a 85% no Plano Cruzado. O
plano se foi
e Sarney terminou o governo com 9% de popularidade, em 1988. Na matéria,
intitulada "O povo está gostando" (3/1/96), o presidente do Ibope,
Carlos
Augusto Montenegro, dizia, sobre o Plano Real, que respaldava FHC:
"Enquanto os
números econômicos forem favoráveis e o brasileiro estiver podendo comer
mais,
pode botar quarenta pastas rosas, trinta sivans que não haverá queda na
popularidade de FHC". Montenegro se referia aos escândalos políticos,
que não
teriam o poder de atingir o chefe do governo.

Com uma
popularidade – dele próprio, não de seu governo – que atinge os 92% na
região
Nordeste e junto aos eleitores que ganham até um salário mínimo, o
presidente
Lula será o grande eleitor das eleições de outubro. Segundo a mesma
pesquisa,
27,1% dos entrevistados apenas votariam num candidato indicado por Lula;
apenas
3% votariam exclusivamente num candidato de FHC. Dos ouvidos, 20,7% não
votariam
num candidato de Lula; 55,4% rejeitam um candidato de FHC. Mais
eleitores – 44%
– levam em conta prioritariamente os benefícios econômicos e sociais do
governo
do que a experiência administrativa do candidato (34,9%). A esmagadora
maioria
dos entrevistados se declara satisfeito com a vida que está levando hoje
– 10%
estão muito satisfeitos e 73% estão satisfeitos.

É difícil
montar uma estratégia oposicionista eficiente num quadro tão favorável
ao
governo como esse. Por isso ganham relevo dossiês cujo conteúdo não se
tornam
públicos e denúncias com sentido dúbio. É a tática de firmar sensos
comuns por
repetição de fatos cujo conteúdo não é claro, mas emergem acompanhados
de um
julgamento moral que atribui intencionalidade subjetiva e maliciosa aos
adversários, mesmo que racionalmente não se identifique razões para
isso. Se
colar, colou. Se não colar, deixa-se de lado e se prepara um novo
ataque.

O que se
destaca no momento eleitoral que a ofensiva oposicionista é
proporcionalmente
mais agressiva do que as próprias pesquisas eleitorais, que ainda
registram um
equilíbrio nas posições de Dilma e Serra. Sinal que o diagnóstico
oposicionista
é o de que a situação é boa demais para o governo, para não ser
igualmente boa
para a candidata do governo.

Artigo de Maria Inês Nassif (Jornalista), publicado no Valor Ecônomico

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