Aldeia Nagô
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Yin e Yang: o equilíbrio do movimento por Leonardo Boff

4 - 5 minutos de leituraModo Leitura

A tradição do Tao vê a história como um jogo dialético e complementar de dois
princípios: yin e yang, forças  subjacentes a todos os fenômenos humanos e
cósmicos. Procurando luzes para entender e sair da crise global  talvez este
olhar holístico dos sábios orientais nos possa inspirar.


A figura de
referência para representar estes dois princípios é a montanha. O lado norte,
coberto pela sombra, é o yin, que em chinês quer dizer sombreamento e
corresponde à dimensão Terra. Ele se expressa pelas qualidades da anima,
do feminino nos homens e nas mulheres: o cuidado, a ternura, a acolhida, a
cooperação, a intuição e a sensibilidade pelos mistérios da vida.
 
O yang
significa a luminosidade do lado sul e corresponde à dimensão Céu. Ele ganha
corpo no animus, as qualidades masculinas no homem e na mulher como o
trabalho, a competição, o uso da força, a objetivação do mundo, a análise e a
racionalidade discursiva e técnica.
 
A sabedoria milenar do Taoísmo
ensina que estas duas forças devem ser balanceadas para que o caminhar das
coisas se faça de forma, a um tempo, dinâmica e harmônica. Pode ocorrer que uma
predomine sobre a outra, mas importa buscar,  o tempo todo, o equilíbrio difícil
entre elas.
 
O yin e o yang remetem a uma energia mais originária, um
círculo que contem a ambos: o Shi. O Shi é a energia cósmica que tudo
sustenta, penetra e move A teologia yorubá e nagô, tão presentes na Bahia,
ensina que essa energia é o Axé universal, com as mesmas funções do
Shi. Os cristãos falam do Spiritus Creator, ou do Sopro
cósmico, que enche e dinamiza toda a criação. Os modernos cosmólogos se referem
à constante cosmológica que é Energia de fundo que produziu aquele minúsculo
ponto que se inflacionou e depois explodiu – big bang – dando origem ao
nosso universo. Após esta incomensurável explosão a Energia de fundo se
desdobrou nas quatro forças fundamentais que atuam sempre juntas e que subjazem
a todos os eventos – a energia gravitacional, eletromagnética, nuclear fraca e
forte – para as quais não existe, na verdade, nenhuma teoria
explicativa.
 
Nossa cultura ocidental, hoje globalizada, rompeu esta
visão integradora e dinâmica. Ela enfatizou tanto o yang que tornou anêmico o
yin. Por isso, permitiu que o racional recalcasse o emocional, que a ciência se
inimizasse com a espiritualidade, que o poder negasse o carisma, que a
concorrência prevalecesse sobre a cooperação e a exploração da natureza
descurasse o cuidado e o respeito devidos. Este desequilíbrio originou o
antropocentrismo, o patriarcalismo, a pobreza espiritual, a cultura materialista
e predadora e a atual crise ecológica global.
 
Somente com a integração
da força do yin, da anima, da logique du coeur (Pascal), do mundo
dos valores, corrigindo a exacerbação do yang, do animus, do espírito de
dominação, podemos proceder às correções necessárias e dar um novo rumo ao nosso
projeto planetário.
 
Na tradição do cânon ocidental expressamos o mesmo
fenômeno do yin e do yang referindo-nos a duas figuras mitológicas: Apolo e
Dionísio.
 
A dimensão Apolo está no lugar da ordem, da razão, da
disciplina, numa palavra da lei do dia sob a qual se rege a sociedade
organizada. A dimensão Dionísio representa a liberdade face às leis, a coragem
de violar interditos, a exaltação da alegria de viver e a inauguração do novo,
numa palavra, a lei da noite, que é o momento em que as censuras caem e tudo
fica gris e indefinido.
 
Atualmente vivemos uma conjuntura toda
particular, marcada pelo excesso. Perdemos a coexistência do yin com o yang, de
Apolo com Dionísio. Se não encontrarmos um ponto de equilíbrio tudo pode
acontecer, até um flagelo antropológico. Precisamos de uma loucura sábia que
possibilite uma nova síntese entre esses dois pólos para reinventar um novo
caminho que nos garanta o futuro.

Leonardo Boff é autor de Etica da
vida: a nova centralidade
, Record 2009.

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