A Lígua do Homens Comuns por Geraldo Maia
Através da religião da ciência os governos tentam
deliberadamente retirar do povo todo o seu potencial inato de organização social
e política. A ciência então é "vendida" como a única capaz de determinar e
conduzir os destinos da sociedade o que coloca a cidadania à margem da margem.
A
ciência garante ser capaz de iluminar a escuridão do mundo com seu toquinho de
técnica, mas o que consegue mesmo é manter a todo custo a pedagogia do "eu mando
e você obedece" e reserva para os "desobedientes" o recolhimento ou a morte. É
assim que consegue manter os privilégios, vantagens, benefícios e a hierarquia
dos que se submetem ao que a ciência lhes empurra garganta abaixo.
Estamos no limiar de um tempo em que o senso comum, os
saberes, dizeres e poderes do povo começam a ampliar seu espaço frente ao
domínio quase absoluto do poder da ciência eurocêntrica, branca, cristantan. O povo quer trazer,
generosamente, para o processo de construção da sociedade a sua herança
ancestral índia e negra, a sua visão de mundo, sua cosmogonia, seu pensamento
filosófico, sua tecnologia e ciência, sua arte, suas formas de organização
política e social, sua literatura, sua poesia, sua magia, suas DeusasDeuses, sua
ternura e poder.
È o
que observei ao participar como convidado do Seminário de Literatura de
Cachoeira, "A Língua dos Homens Comuns"
, fruto da iniciativa do povo representado por seus poetas, escritores,
produtores de cultura, artistas, empresários, professores e alunos conscientes
da necessidade de se romper o fosso secular existente entre a academia e a
sociedade e que à custa de muito esforço, pique e dedicação, utilizaram a
Universidade Federal do Recôncavo como uma das ferramentas que proporcionaram
junto com o Pouso da Palavra, do poeta Damário da Cruz, o Centro Cultural
Dannemann, a Casa de Barro, as diversas pousadas e restaurantes, quer dizer, a
população local interessada, a efetiva realização do Seminário.
Para
o menos avisado pode parecer que foi a UFRB, através de seus professores e
alunos, que teve a iniciativa do Seminário, mas na realidade é o contrário, a
iniciativa foi da comunidade que quer saber como tornar a academia algo
realmente a serviço de todos.
Com
raras exceções, o Seminário foi realmente a cara, a língua e a expressão das
pessoas comuns, de todos os gêneros, raças, credos e ideologias, e isso é o que
o torna especial e imprescindível a sua continuidade como espaço original, raro,
rico de pluralismo, de liberdade, de criatividade, de rebeldia, e de exercício
pleno de cidadania. Afinal, está nas mãos do povo a organização e a condução das
políticas públicas para o beneficio de todos e não apenas dos que a ciência
serve e é bem servida.
Pessoas como Nuno Gonçalves, Maíra Castanheiro, João de
Moraes, Raquel Pinto, Renata Pitombo, Lucas Café, Thiago Alberto, Washington
Andrade, Vitor Brito, Zaine Gabriela, Bruno Araújo, Elton Vítor, Gabriel Amaral,
Gislene Mesquita, Camila Andrade, Laiz Fraga, Jurandir Rita, Crispim Quirino,
alunos, poetas, escritores, professores e artistas são os principais
responsáveis pelo sucesso e originalidade do evento. Parabéns e obrigado.
Geraldo Maia participou como convidado na Mesa de
Debates: Poetas na Praça: Marginalização, Popularização e Revolução da Poesia
dos anos 80 na Bahia e realizou a oficina "Poesia e Metrificação".