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Comportamento Candomblé é mistério, meu nego! por Tiganá Santana
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Comportamento
Sáb, 21 de Março de 2009 18:23
  Senhoras e senhores: são tempos de invasão ao mistério. O chamado Ocidente (que não se trata de uma topografia), no elixir da sua "Modernidade de Esclarecimento", soergueu em muitos dos seus pensadores e pensantes uma racionalidade fálica e devastadora, a fotografar e estatizar o dinamismo da realidade (e da supra-realidade). Folhas, vento, modos, canto, terra, astros... tudo se enquadrava nas categorias de evidência, resolubilidade ou exclusão. O mistério excluía-se. Ainda hoje vivemos espasmos desta Modernidade.

 Acreditamos na infalibilidade do doutoramento... no que se diz ou escreve, a partir de uma instituição. O que se crê em silêncio e, portanto, não pode ser partilhado discursivamente na ágora, não poderá ser ou será sempre perseguido pela suspeita suprema e imbatível do "real conhecimento". São tempos de mistericídio.

Na Bahia, tem acontecido outra sorte de assassínio deste mistério. Assomam-se às instituições de ensino (superior ou não) os comunicadores artísticos que expõem ao entretenimento os cânticos litúrgicos do Candomblé e religiões de matriz africana. Os "senhores da diversão" tornaram cânticos, toques, danças, vestes e mesmo ritos de Candomblé um conjunto circense para a apreciação carnavalesca de quem flerta, bebe e se desorienta. Urge entender que não se trata esta de uma religião de proselitismo e conversão, a utilizar-se das mais diversas estratégias para agregar fiéis.

Trata-se de uma religião de inerência - ainda àqueles que se originam de outros sítios culturais. Crê-se nas divindades dentro e fora do templo, vivenciamo-las em nosso próprio corpo, mas as cultuamos no templo. Evocá-las através dos cânticos requer preparação, configuração, contexto, entrega. Nem tudo de negro é para divertir. Convença-se o mundo disto! Convença-se disto uma Bahia que, ao longo de anos, ao lado do Rio de Janeiro, imprime ao "outro" um conjunto imagético frágil, risível, multicromático, sexual e superficial de culturas negras descendentes e precedentes. O Candomblé é uma religião de mistério e organização. Há o momento da fala e do calar; da iniciativa e da espera; do colorido e do branco; da criança e do velho.

É mais louvável, legítimo e belo que cantemos algo que se referencie no Nkisi, Orixá, Vodum, Caboclo do que a reprodução literal das palavras ali vocalizadas dos cânticos deste próprio Nkisi, Orixá, Vodum, Caboclo. A arte, inclusive, é um delicado moinho de interpretação e expressão de coisas que existem. Jamais poderá ser reprodução, ainda que queira o artista.

Apropriar-se desta manifestação do sagrado e sustentar-se financeiramente disto é colonialista demais. É importante que as pessoas saibam do Candomblé. É claro e por razões inumeráveis, sólidas, basilares. Entretanto há setores fundamentais que dizem respeito às pessoas que são o Candomblé - e estas, certamente, não andam por aí conspurcando o seu sagrado, o seu mistério. Muitos religiosos neo-pentecostais aspiram a magoar o coração daqueles que professam a religião do Candomblé. Não o farão. São externos demais a este culto ancestral e presente.

Todavia aqueles que dizem ser ou simpatizar com tal religião e a devassam na sua postura inadequada podem, com esta "amizade inimiga", de fato, ferir o coração, o qual aqui assume o sentido banto de interioridade (muxima, mutima, ntima). Em nome da bíblia, da razão, da rentabilidade, todos confluentes para o lar de uma específica ignorância, o mistério é fuzilado e o Candomblé resguarda-se a cada vez menos pessoas efetivamente... afinal, são tempos de desprezo pelo mistério.

*Tiganá Santana é compositor, cantor e xicarangoma do Terreiro Tumbenci (Lauro de Freitas-BA).   Publicado originalmente em www.atarde.com.br/blog/mundoafro/index.jsf

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