Bolsonaro e o brasileiro medíocre, por Sergio Saraiva
A candidatura Bolsonaro representa um estrato socioeconômico bem definido da sociedade brasileira e que precisa ser considerado como relevante. São os “apolíticos revoltados”.
Tratá-los com termos depreciativos – os “bolsomínions” – ou considera-los “analfabetos políticos“ e, por via de consequência, irrelevantes politicamente, é um erro que as forças progressistas não podem cometer. Os eleitores de Bolsonaro são uma força política considerável e se percebem assim.
Lembremos Umberto Eco, eles são a massa de que o fascismo, em alguma das suas múltiplas facetas, necessita para se implantar no Brasil. Ainda que Bolsonaro sequer se entenda como um fascista ou, ele e seus eleitores, tenham qualificação suficiente para entender o que venha a ser o fascismo.
Quem é o eleitor de Bolsonaro
Em quem vota um homem branco, jovem de até 34 anos, com ensino médio, sem preferência partidária, que mora no Sudeste, em uma cidade de média para grande? Esse eleitor é um trabalhador com proteção trabalhista (com registro em carteira ou funcionário público) e tem renda entre 3 e 5 salários mínimos.
Vota em Bolsonaro.
Isso é o que mostram os dados de perfil de amostra da pesquisa Datafolha encerrada em 30 de novembro de 2017.
Nessa descrição de perfil, há alguns dados interessantes em relação a Bolsonaro.
O primeiro é que seu eleitorado é essencialmente masculino – 64%. Nenhum outro candidato tem índice sequer próximo. Lula, dos candidatos homens, é o que tem o maior índice de eleitores do gênero feminino 55%.
67% dos eleitores de Bolsonaro não têm preferência partidária. Nem poderiam. Alguém sabe qual é o partido de Bolsonaro? O PSC. Alguém sabe o que significa a sigla PSC? Partido Social-Cristão. Alguém sabe o que significa a qualificação “social-cristão”? Pois então.
Seu eleitorado é essencialmente jovem – 59% têm até 34 anos. Nascido a partir de 1993, não sabe o que foi a ditadura. Quando muito, estudou o período na escola.
58% dos eleitores de Bolsonaro têm escolaridade de nível médio. Índice do qual também nenhum outro candidato se aproxima. Bolsonaro é o candidato do nível médio de escolaridade.
Assim como dos que têm renda entre 3 e 5 salários mínimos – 25%. Dos eleitores de Lula, 60% ganham até 2 salários mínimos. Os eleitores mais ricos, até a faixa de 50 salários mínimos ou mais estão com Alckmin.
Nota-se um forte componente evangélico na formação dos seus eleitores – 40% dos eleitores de Bolsonaro se dizem evangélicos. Mas a maioria é católica 45%. Para perceber-se a predominância evangélica entre os eleitores de Bolsonaro, é preciso notar que é o maior índice entre todos os candidatos – igual ao de Marina Silva. Lula tem um índice de 31% de eleitores evangélicos. E é o segundo.
Em relação à religião, há outros dados interessantes na pesquisa Datafolha: os espíritas e kardecistas votam Alckmin. Já os umbandistas, ateus e agnósticos e judeus votam com Manuela D’Ávila.
Quando perguntado sobre a cor da pele, o eleitor de Bolsonaro se diz branco – 40% ou pardo 39%, mas não se considera preto – 14%. Para se perceber o baixo índice de eleitores que se dizem pretos, é preciso comparar Bolsonaro com Lula e Alckmin. Lula é o mais preto – 21% e Alckmin o menos preto – 10%. Bolsonaro está muito mais próximo de Alckmin do que de Lula.
50% dos eleitores de Bolsonaro estão no Sudeste. Alckmin tem 76% de seus eleitores nessa região e Lula 32%. Bolsonaro é um candidato com maior penetração nacional do que Alckmin que mostra-se um candidato com apelo apenas regional.
Bolsonaro e o brasileiro medíocre
Essa caracterização do eleitorado bolsonarista não se dá por qualquer curiosidade folclórica. Ao contrário. Quem se interessa por política, deve passar a dar uma boa dose de atenção a ele. Porque trata-se de um estrato bem definido do nosso quadro social.
O eleitor de Bolsonaro é o homem medíocre. Mas medíocre no que o termo “medíocre” tem a ver com mediano. É um homem jovem, com uma renda que não lhe dá qualquer folga no orçamento para gastos maiores, mas que não passa por necessidades financeiras. Não tem formação superior, mas não é um analfabeto.
Os apolíticos revoltados
O eleitor de Bolsonaro é o típico que não se interessava por política. Mas foi capturado pelo clima de contestação que tomou conta do Brasil a partir de 2013. Hoje é um militante apaixonado. Porém, não tem o perfil dos que vestiram camisa amarela e foram para a Paulista atrás do “pato da FIESP”. O leitor de Bolsonaro ficou assistindo futebol e bebendo cerveja, naqueles domingos.
O eleitor de Bolsonaro não apoia Lula. Por seu perfil socioeconômico, tem preconceitos em relação ao que Lula, o petismo e as forças progressistas representam. Mas o eleitor de Bolsonaro não é um conservador clássico. Não tem renda ou patrimônio suficientes a conservar. É mais um reacionário que um conservador. O eleitor de Bolsonaro, no entanto, não bateu panelas.
Logo, o eleitor de Bolsonaro não se sente representado por Lula ou pelo PT e nem pelas forças políticas que tomaram o poder com o Golpe de 2016. Apenas 5% dos eleitores de Bolsonaro consideram o governo Temer ótimo ou bom. 67% o consideram ruim ou péssimo.
Por medíocre, o eleitor de Bolsonaro tampouco é um eleitor de centro. É um radical que acha que sabe o que não quer, mas não sabe o que quer. Espera porém um solução “mágica” para os problemas do país.
Esse eleitor, no entanto, não foi conquistado politicamente pela propaganda da grande imprensa que alardeia que tudo está melhor. O eleitor de Bolsonaro é um “apolítico revoltado”. Assiste às novelas da Globo. Despreza a Globo como força política. Desconfia. Pressente que está sendo manipulado. Confuso, mas não idiota.
Ocorre que, agora, esse eleitor encontrou alguém em quem se sinta representado – Bolsonaro. Não por acaso, uma mediocridade em termos políticos.
Bolsonaro presidente
Bolsonaro tornou-se um fenômeno político que vale por si próprio. E que precisa ser considerado como tal. Com 11% de intenções espontâneas de voto em trajetória ascendente – Lula tem 17% estabilizados – Bolsonaro está em corações e mentes de um estrato definido de brasileiros. Mas uma parcela considerável.
Bolsonaro é a segunda força eleitoral para 2018 e está paradoxalmente no campo da oposição. A direita tradicional já percebeu e começou a bater em Bolsonaro. Sim, Bolsonaro é algo como nossa “alt-right”.
Com Lula concorrendo em 2018, tal parcela não fará, por si só, Bolsonaro presidente.
Mas Lula deve ser impedido.
Então… viva os medíocres.
Artigo publicado originalmente em https://jornalggn.com.br/blog/sergio-saraiva/bolsonaro-e-o-brasileiro-mediocre-por-sergio-saraiva