Aldeia Nagô
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Faltam mulheres na política por Nilmário Miranda

4 - 5 minutos de leituraModo Leitura

Nas eleições de 2008 o
número de mulheres eleitas como prefeitas e vereadoras foi pequeno, como já
tinha ocorrido em 2006 nas eleições gerais.


A presença de mulheres no poder
político está congelada. Não cresce nem vai crescer se não mudarem as regras do
jogo. Não é um problema para as mulheres enfrentarem, como se fosse uma demanda
corporativa. Homens e mulheres têm que representar o conjunto de homens e
mulheres. A escassa participação de mulheres no poder público é um déficit na
democracia no Brasil. Por que as mulheres não ascendem ao poder político? Por
que o poder político não incorpora as mulheres?




É um escárnio considerar que falta interesse ou
capacidade às mulheres. Os homens comparecem em menor número que as mulheres nas
eleições, se abstêm mais, votam em branco ou anulam os votos em maior número que
as mulheres. As mulheres participam em escala crescente como protagonistas em
todas as áreas que atuam na esfera pública – sindicatos, associações, atividades
pastorais, universidades, conselhos – o que lhes confere mais legitimidade como
atores políticos.




Há certamente um
conjunto de fatores psíquicos, culturais e políticos que interferem para
interditar ou filtrar o acesso das mulheres aos espaços de poder no Legislativo,
no Executivo e mesmo no Judiciário. No entanto, as regras ou a falta delas são
determinantes.




A posição do Brasil no
ranking de participação de mulheres em cargos públicos é constrangedora. Das 513
vagas para deputados, só 46 são ocupadas por mulheres (9%). No Senado são 10
mulheres para 81 vagas (12,3%). Na Argentina com 35% e na Costa Rica com 38,6%
mudaram as regras e a iniqüidade foi reduzida de forma exemplar. Outros países
como Equador e Espanha reconheceram a essencialidade da participação feminina e
estenderam as regras para o Executivo.




Democracia requer
ruptura com privilégios e efetiva igualdade para o exercício da cidadania e
acesso aos espaços de decisão no Legislativo, no Executivo e no
Judiciário.




Quanto mais poder,
menos mulheres. A presença de mulheres como governadoras (3 em 27) e prefeitas
não passa de 7,7%. No governo Lula, que instituiu a Secretaria Especial de
Políticas para Mulheres – com status ministerial – a participação de mulheres
caiu das 5 iniciais para apenas 2.




A participação de
mulheres no Executivo não pode depender da magnitude dos governantes. Só houve
avanços notáveis em países que adotaram medidas especiais de caráter temporário
ou permanente que asseguraram participação partidária ou perto disso nos
escalões mais altos do Executivo, de cotas de mulheres no topo das listas
partidárias e financiamento público das campanhas, cada vez mais caras. A
subrepresentação feminina está presente também nas mesas do Legislativo, as
altas esferas de decisão partidária, nos grupos de decisão partidária, nos
grupos de pressão nos tribunais.




Há um círculo vicioso
na reprodução da desigualdade. São tão poucas as mulheres nestes círculos que
suas eventuais falhas e fracassos reforçam a exclusão. Só uma participação mais
ampla, em espaços variados, criará identificação, confiança e motivação para
estimular as mulheres a incursionarem nos espaços decisórios. Enquanto forem tão
poucas, não muda a cultura sobre o papel das mulheres no espaço público e as
próprias mulheres manterão a estranheza e o distanciamento face da política. E
quem perde é a democracia. É verdade que as raízes do problema não estão só na
política. Mas é inegável que no Brasil a política é feita por homens e para os
homens. Política e poder são monopólio dos homens que instituíram seus
interesses como universais.




Não se trata de
idealizar o feminino. No poder, assim como os homens, as mulheres acertam e
fracassam e representam projetos progressistas ou conservadores. A desproporção
de representação política fica mais exacerbada quando se toma a participação das
mulheres negras e indígenas, as mais pobres entre os pobres.




Os debates sobre reformas políticas devem incorporar a
participação das mulheres, maioria da população e do eleitorado nos espaços da
política e do poder.




*Nilmário Miranda é
jornalista, ex-Secretário Especial de Direitos Humanos, e atual presidente da
Fundação Perseu Abramo.




Artigo publicado originalmente no
jornal O Globo, em
24/02/2009.

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