Novos hábitos e velhos botecos. Por Zuggi Almeida |
Qua, 28 de Fevereiro de 2018 08:43 |
Esse tipo de apelo tenho ouvido constantemente nos bares, botecos e pés-sujos que frequento. De repente, surgiu uma exigência do bebedor de primeira hora “ Cerveja tem que ser maltada, esse negócio de cerveja de milho, não é comigo, não !” - uma comoção para não ter de considerar uma calamidade. Só vou se tiver puro malte ! - determina um amigo meu. Essa exigência tenho que cumprir quando convido os news – beers ( expressão minha ) para comer umas sardinhas fritas no Bar de Noélia, aqui em Itapuã. Tem que ser montada toda uma operação logística para atender o new-beer. Minho, filho, gerente, assistente financeiro, comprador e balconista do Bar de Noélia tem que correr no depósito de Arroz e adquirir uma dúzia da alienígena holandesa. São novos hábitos de consumo de um cliente cada vez mais exigente – isso poderia ser dito por um marqueteiro. A propósito, junto com a cerveja puro malte veio o especialista em lúpulo e água destilada que abomina a adição de milho e trigo nas cervejas comuns. Um absurdo ! Para não dizer, um acinte – assim eles se expressam. Os botecos estão cheios deles e entre um gole de destilada com limão discorre sobre a nobreza na constituição de uma cerveja standard larger. “São alguns goles e algumas mordidas. O paladar não pode ficar entediado. A relação da comida com a bebida não pode ser monótona. O paladar precisa ter uma experiência” - essas são algumas dicas de uma sommelier de cervejas. Agora, veja-se bebendo com o cotovelo apoiado no balcão e pronto pra enfiar o palito numa rodela de salame comprado do cara do carro de mão, vai lembrar desse passo-a-passo ? Na moral, essa onda de cerveja é tudo arte do marquetingue. Você lembra quando surgiu aquela cerveja com preço barato e foi taxada de ' bebida dos sem terras” ? Não demorou muito e ela foi aparecendo cada vez mais nas TVs, revistas, programas esportivos, etc. Aí, a empresa fabricante anunciou que tinha contratado um mestre cervejeiro alemão e num passe de Merlin, a mizerave já estava nas taças das dondocas nos camarotes vips do carnaval. Uma ascenção social mais rápida, que a alcançada por uma participante dos bbbs da vida. Coisas do marquetingue. Longe de mim querer ser um nacionalista ( um verdadeiro risco, nesses tempos), mas, ainda sou adepto das cervejas tradicionais, aquelas que você só encontra nos butecos de catiguria. A visgueira que serve aquela charque frita com farofa, molho vinagrete e pimenta. Conheço uma dessas que oferece um tiragosto de pescoço de perú num molho tipo de moela e rodelas de pão cacetinho. Sublime ! Quando vejo aquelas garrafas verdes , tenho lembranças de dólares. Será que é alguma síndrome, tipo, do Policarpo Quaresma ? Mas, não fui contaminado pelo mosquito lupus cerevisiam e sigo consumido as mesmas cervas de sempre, sem me sentir deslocado, fora do contexto ou um bebedor ultrapassado. Sigo contente e feliz pra onde aponta meu nariz ! Aqui com meus botões, enquanto digito esse texto lembrei-me da resenha das terças-feiras que acontece no Bar de Alaíde do Feijão, no Pelourinho. A resenha é um encontro semanal realizado por amigos e frequentadores daquele prestigiado espaço onde se coloca os assuntos em dias, decide-se os destinos políticos do país, resolve-se as maiores crises ambientais, mas, o assunto principal é o duelo BA x VI. Hoje, a resenha substitui aquelas reuniões lá da minha juventude embaixo das luzes dos postes, no bairro da Liberdade. Naquela época a gente reunia 'era pra bater o mite em alguém '. Bons tempos ! Como o assunto em pauta é o consumo da cerveja puro malte e na resenha em Alaíde, cerveja holandesa é quem atualmente manda na mesa, pergunto: Será que os tiragostos de moela feita por Alaíde acompanhada de pão de sal e queijo cuia comprados na padaria Paris vão ser substituídos por salsichão alemão, pão preto e mostarda ? Quem arrisca ? Respostas na próxima resenha. * zuggi almeida é roteirista, produtor cultural e escreve quando quer. |
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