Solidariedades ao Líbano. Foi triste ver quase uma Hiroshima novamente, como se uma ogiva nuclear tivesse sido lançada ao Porto de Beirute. Foi triste ver uma cidade já tão devassada por atentados e guerras sofrer mais mortes e vidros estilhaçados, e prédios demolidos e sonhos interrompidos.
Beirute chorou e choramos por todo o mundo: por Beirute. Mas o Brasil dos generais cruéis e das elites nada bacanas nos presenteia com muitos beirutes, todos os dias, em suas muitas explosões. No Brasil tenebroso dos últimos tempos estocaram nitrato de amônio em infinitos navios abandonados. Foi com nitrato de amônio que se abasteceu criminosamente as naus da democracia. Foi com nitrato de amônio que alimentou os golpes, as prisões ilegais e a hipocrisia dos que não veem crimes em crimes hediondos (praticados todos os dias). E nas urnas de 2018 uma quantidade enorme de nitrato de amônio foi produzida e estocada em navios abandonados em ruas, favelas, portos, mares e florestas. E, desde março, há cinco meses, explosões são ouvidas, corpos despedaçados e sonhos e amores interrompidos, diariamente. A cada dia dez navios explodem. E morrem mais de mil. A cada dia lágrimas encharcam ruas e oceanos. E não há anestésico suficiente para aplacar essa dor. E quem vai chorar nossas beirutes? Quem vai dizer basta? Quem vai retirar o entulho monstruoso de nitrato de amônio que teima em nos explodir e provocar uma dor infinda e levar para portos distantes? Não será suficiente o choro do Papa Francisco, não será suficiente a bandeira do Brasil projetada no prédio da FIESP. Não será suficiente uma declaração pesarosa das Nações Unidas. Nossas beirutes explodem e choro dos que perderam Marias, Antônios, Franciscos, Josefas, Matildes, Fernandos, Aritanas, Silvestres... é ouvido em todos os cantos, contados até 100 mil. Para que não ocorram mais mortes. Quem vai chorar nossos beirutes? E quem vai transformar o choro em revolta e a revolta em ação contra o genocídio de tantas beirutes explodidas no Brasil?”
Renan Araújo é médico |