O breque inesperado. Por Zuggi Almeida
Domingo, onze e meia da manhã e o samba ferve na temperatura elevada da varanda do boteco em Itapuã.
O repertório combinando de modo perfeito com a cerveja gelada e os tiragostos saídos da cozinha em períodos exatos.
O boteco da rua do Palame ousou quando convidou um grupo de samba para abrir os serviços às 10 da manhã, exatas.
O cidadão pode acordar, tomar um banho, vestir uma roupa descontraída, dar um drible na mesa do café e seguir direto pro bar
Lá, encontra ainda fumegante, um brunch para os fortes que pode ser galinha caipira acompanhada de pirão e molho de pimenta, feijoada, rabada, mocotó ou algo mais leve como um ensopado com aipim.
Tem coisa mais frugal ? A cachacinha de qualidade e a gelosa dão o equilíbrio necessário.
Assim seguia o samba:
” Domingo, lá na casa do Vavá
Teve um tremendo pagode
Que você não pode imaginar…
A marcação dava o ritmo, até que ela surgiu no passeio do outro lado da rua.
Aí, deu-se o breque inesperado e o samba ficou preso na garganta da rapaziada.
Ela possuía uma sinuosidade elegante, senão dizer perfeita. Eram dois imensos globos que faziam movimentos opostos,mas, numa simetria de fazer inveja ao mais exigente dos físicos, matemáticos ou regentes de orquestra.
Estava coberta por panos simples, que adquiriam a importância de um manto sagrado protegendo uma obra de arte, mesmo naquela ambiente mundano
Aquela região destacava-se do restante do corpo numa elevação súbita, mas, terminava uma descida harmônica e suave.
Do lado de cá, na mesa do samba surge o primeiro comentário, óbvio e consensual;
– Que mizéra é essa meu Deus ?
Incrível que em tempos de Google, o ser humano ainda busque respostas do supremo para as coisas inexplicáveis aqui na terra.
Aquele escultura viva era uma delas.
O estudante de engenharia que arriscava tocar o tamborim alegou para a existência dos senos, cossenos e das curvas simétricas e assimétricas, etc e tal.
Antes que algum teórico arricasse desenvolver uma tese acadêmica, a dona do acervo dobrou a esquina da rua Flor do Bosque e desapareceu.
…Provei do famoso feijão da Vicentina
Só quem é da Portela é que sabe
Que a coisa é divina.
E o samba retornou pra varanda, agora com muito mais régua e compasso.
Zuggi Almeida é baiano, escritor e roteirista