Por que há tantos engenheiros na Al-Qaeda? Sem ofensa aos meus amigos engenheiros… Por Pedro Dória
Muitas vezes, é interessante buscar ângulos inusitados para observar
problemas. Diego Gambetta e Steffen Hertog, sociólogos da Universidade
de Oxford, perceberam por exemplo que, entre os terroristas da
al-Qaeda, há muitos médicos e engenheiros e que, destes, os engenheiros
são maioria. Por quê? Sua pesquisa (artigo em PDF) começou na busca de
estudos sobre as características de engenheiros.
De início, uma pesquisa da Fundação Carnegie em vários departamentos
universitários dos EUA revelou que, dentre engenheiros, médicos,
advogados, cientistas das exatas, economistas e cientistas sociais, os
engenheiros tendem a se classificar mais conservadores, mais à direita,
do que todos os outros. (Colocando em números: 57,6% dos engenheiros se
classificam como conservadores, contra 51,1% dentre os economistas,
42,5% dentre os médicos, 33,5% dentre cientistas exatos.)
Outra pista veio de um estudo do economista Friedrich von Hayek, prêmio
Nobel, que segue a linha liberal:
Engenheiros são fruto de uma educação que não os treina para compreender
indivíduos e seu mundo como o resultado de um processo social no qual
comportamento espontâneo e interações contribuem para o resultado final. O
contrário: a educação do engenheiro o leva a crer que o controle racional de
processos é desejável. Isso os leva a dificuldades com as causas confusas das
realidades política e social e os inclinam a imaginar sociedades que deveriam
operar ordenadamente como máquinas bem azeitadas. ‘Não surpreende’, sugere
Hayek, ‘que algumas das mentes mais ativas dentre eles cedo ou tarde reajam
violentamente por conta das deficiências de sua educação e desenvolvam o desejo
de impor à sociedade uma ordem que não conseguem detectar.’
Antes de continuar o raciocínio, é bom destacar: von Hayek escreveu sobre
engenheiros em 1952. Quando descrevia assim o comportamento tomado por alguns
engenheiros, por certo tinha em mente dois tipos de totalitarismo diferentes do
atual, islâmico; ele tinha em mente o nazismo alemão e o stalinismo soviético. E
os autores do artigo sabem disso.
Os dados são delicados. Não há muitos
engenheiros na Fatah (laica), fundada por Yasser Arafat. E, dentre grupos
oposicionistas de esquerda da Turquia e do Irã, há muitos engenheiros. É
principalmente na Arábia Saudita – mas também em outros países árabes -, que,
dentre os terroristas, há um número elevado de engenheiros.
Engenharia e
medicina, nestes países como em outros, são os cursos de elite. Destes, a
engenharia em particular, nos países árabes, petrolíferos, reúne as
características de ser um curso de elite, prático e que não desafia o estudante
a questionar sua religião. (Medicina, como as ciências, o faz.) Em países que buscam o desenvolvimento, engenheiros – como médicos
– estão dentre os jovens profissionais que mais se frustram. Embora sejam a
elite acadêmica, alguns dos melhores alunos que foram mais pesadamente testados
ao longo do curso, não necessariamente encontram boas oportunidades
profissionais ao deixar a universidade.
Aqui, para os autores do
estudo, 1982 é um ano chave: o pico da Crise do Petróleo iniciada nos anos 1970,
que arrebentou com várias economias no Oriente Médio, eliminou oportunidades
profissionais. É mais ou menos nessa época que grupos fundamentalistas islâmicos
começam a se fortalecer em várias universidades da região.
Este é um estudo
de caso que se aplica, particularmente, ao Egito e à Arábia Saudita. É muito
fácil generalizar a partir dele – o que seria perigoso. Talvez, realmente,
jovens engenheiros – Osama bin Laden é um, Mohammed Atta, líder do Onze de
Setembro, é outro – tenham uma predisposição maior, dados cenários específicos,
a abraçar discursos totalitários da imposição de uma ordem social.
Mais
interessante é a observação de que estes grupos fundamentalistas se fortaleceram
realmente dentro de universidades num período de profunda crise econômica. Ou
seja, numa época em que as jovens elites acadêmicas dos
países árabes estavam chegando ao mundo profissional sem
oportunidades.
Do Blog do Pedro Dória
http://www.pedrodoria.com.br/