Representação ao MPF. Liberdade Para Todos. Por Eduardo Guimarães
Não escrevi nada antes sobre o assunto que vou tratar agora
porque, como vinha anunciando desde janeiro que o Movimento dos Sem-Mídia
iria representar contra meios de comunicação ao Ministério Público
por conta do alarmismo na questão da febre amarela e estava demorando em
concretizar a denúncia, achei melhor parar de falar até que pudesse dizer que
estava feito.
Esse passo que o Movimento dos Sem-Mídia disse que daria, demorou a ser
dado porque reunir as evidências da representação que protocolei
no MPF foi extremamente trabalhoso.
Contudo, hoje, 17 de março de 2008, às 15 horas, protocolei, no Ministério
Público Federal, em São Paulo, uma representação da ONG Movimento dos Sem-Mídia
que pede à instituição que investigue se os meios de comunicação promoveram
alarmismo durante o mês de janeiro disseminando a hipótese de que haveria uma
epidemia de febre amarela urbana no Brasil.
O número do protocolo da representação entregue ao MPF é:
PR/SP-SEPJ-001848/2008.
Os veículos citados inicialmente são: Grupo Folha, Grupo Estado, Grupo Abril,
Organizações Globo, Jornal do Brasil, jornal Correio Brasiliense, revista Veja
e revista Isto.
Quem quiser ler a íntegra da representação, o Luiz Carlos Azenha publicou
o material na íntegra (clique aqui
para ler). E para ouvir o áudio da entrevista que dei ao Conversa Afiada,
clique aqui.
Só peço ao Azenha e ao Paulo Henrique Amorim que não divulguem o Anexo I da
representação, pois contém os elementos probatórios apresentados ao MPF e não
quero facilitar a vida dos meios representados. Eles que vão ao MPf verificar
os termos da nossa representação…
Também quero agradecer e cumprimentar as pessoas que ajudaram a tornar possível
essa atitude da sociedade civil que poderá ser o começo de um processo que
culmine com a adoção pela mídia da necessária responsabilidade que devem ter
aqueles que lidam com uma matéria tão delicada quanto é a informação.
Cumprimento :
· Conceição Lemes, jornalista
especializada em Saúde, que orientou o MSM, passo a passo, em todas as questões
técnicas, a fim de que a peça jurídica que compusemos fosse absolutamente fiel
aos fatos.
· Antonio Donizeti da Costa, diretor
jurídico do MSM, que deu forma legal ao documento.
· Antonio Arles, 1º secretário do
MSM, em sua busca exaustiva para reunir o material probatório da teoria
proposta ao MP.
Agradeço:
· Luiz Carlos Azenha
· Paulo Henrique Amorim
· Renato Rovai
· Vermelho.org
O apoio desses jornalistas e do site Vermelho foi e será importantíssimo para
que a representação seja divulgada e efetivamente "ande", pois é
interesse de toda sociedade que o tipo de conduta da grande mídia que redundou
na perda de ao menos uma vida humana e na doença de várias pessoas, não se
repita.
Escrito por Eduardo Guimarães
às 17h00
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16/03/2008
Liberdade para todos
Persisto no assunto liberdade de imprensa. Esse conceito precisa ser muito
discutido, pois crimes vêm sendo cometidos em seu nome desde que a imprensa
surgiu e, de novidade, converteu-se num dos pilares das sociedades
modernas e democráticas.
Não se pode conceber uma sociedade sem uma imprensa atuante, influente e
que tenha meios de contestar os poderes constituídos, eventualmente se
convertendo em porta-voz dos setores que não teriam meios de levantar suas
vozes contra os setores mais poderosos e influentes. Ao longo da história,
porém, a imprensa foi se convertendo, em grande parte, em porta-voz
de grupos sociais bem específicos, sempre negando esse papel e alardeando
suas atuações em momentos em que teve que se unir ao mesmo interesse comum
que antes violara.
Nesse aspecto, vale revermos manifestação de um comentarista deste blog que vem
se manifestando com freqüência, mas que, à diferença de vários dos que vêm aqui
protestar contra a linha editorial do Cidadania, divergiu de maneira
civilizada, ainda que o conteúdo dessas manifestações venha eivado de
meias-verdades. Leiam abaixo, portanto, comentário do leitor Antonio Thadaz, de
Curitiba:
"(…) você diz aos jovens que no seu tempo (nosso) as esquerdas tinham
que se manter caladas. E caladas elas roubavam bancos, seqüestravam
embaixadores, explodiam bombas, mutilando inocentes, e faziam guerrilha no
Araguaia. Hoje, esse pessoal recebe gordas pensões do governo, inclusive o
Lula.
Como sei tudo isso ? Imprensa. Nos tempos duros, o JB, censurado, publicava
receita de bolo no lugar da notícia. Otávio Frias tem uma longa história de
resistência ao regime de exceção, Boris Casoy que o diga. O Mesquita abrigou,
em sua redação, jornalistas perseguidos.
Dos grandes jornais, O Globo foi o único que teceu louvaminhas aos militares.
Ou seja, a maioria da tal família midiática tem história na luta pela
liberdade, liberdade essa que oportunizou [sic] ao Lula fundar e difundir seu
partido.
Afirmar que a mídia de hoje paralisa o congresso [sic], atrasa projetos e
provoca catarses coletivas é conferir à imprensa um poder que ela não tem.
Orson Welles morreu e não deixou herdeiros."
Pelo que o leitor escreveu, ele deve ser da minha geração. Estranho, no
entanto, que não saiba que quem viabilizou a ditadura militar de mais de 20
anos no Brasil foram exatamente os Mesquita, Frias e Marinho, com seus jornais,
tevês e revistas acossando o governo legalmente constituído de Jango Goulart.
Parece-me raro, ainda, que o mesmo leitor não recorde do Riocentro, onde,
nos estertores da ditadura militar, a ditadura colocou uma bomba, na
tentativa de forjar que tinha sido colocada por aqueles que caçava,
prendia, torturava e matava.
Mas o leitor em questão levanta, ou melhor, torna mais
evidente o tema liberdade de imprensa. Essa liberdade de um meio de
comunicação – ou de vários – difundir informações e opiniões tem
que ser acompanhada da pluralidade opinativa mais ampla, geral e
irrestrita. Liberdade para informar sempre deverá pressupor liberdade de
contestar o que foi informado. Quando a imprensa informa só o que quer, seja em
termos de notícia ou de opinião, e não admite que se conteste o que
divulgou, não há liberdade de imprensa nenhuma.
Liberdade de imprensa sempre será um bom conceito, desde que
seja para todos os que fazem jornalismo. A liberdade de
imprensa que os grandes jornais, tevês e assemelhados pedem, no entanto, é
para poucos (só para eles mesmos). Ao mesmo tempo em que pedem liberdade de
expressão para si, combatem a de quem não for ungido por eles.
Têm sido freqüentes, na grande mídia, ataques à maior inovação ocorrida no
jornalismo desde seu surgimento, o fenômeno dos blogs. Hoje mesmo (domingo), na
Folha de São Paulo, o escritor e jornalista Carlos Heitor
Cony classifica de "chatos" os que fazem uso da tecnologia para
participarem dos grandes debates nacionais. Lamenta que a internet tenha
viabilizado para qualquer um a liberdade de difundir opiniões e informações
em larga escala. Quer que a liberdade de imprensa seja só para os ungidos
pelo grande jornalismo.
Diante de tais premissas, pode-se formular algumas questões:
Quando essa "liberdade de imprensa" é usada para
insuflar militares para que dêem um golpe de Estado, a fim de depor um
governo que desagradava aos multimilionários donos de grandes cadeias de
rádio, tevê, jornais e revistas, que liberdade é essa?
Como pode ser chamado de "liberdade" fazer uma
campanha que pede que a vontade eleitoral da maioria de uma nação seja
violentada em benefício da vontade dos derrotados eleitoralmente?
Quando os meios de comunicação divulgam que há uma epidemia
de febre amarela no país e, com isso, alarmam a sociedade, de forma que pessoas
que não tinham risco de contrair a doença tomam, aleatoriamente, um medicamento
controlado que pode lhes causar danos, que liberdade é essa?
Aliás, tais práticas constituem liberdade de
informar ou de sabotar?
Liberdade só é liberdade se todos puderem desfrutar dela. Quando a liberdade
que se pede é igual a essa que os magnatas da comunicação pedem, que é só para
eles, suas empresas e seus prepostos ditos jornalistas, mas que viola,
cotidianamente, todos os princípios jornalísticos que remetem à pluralidade de
idéias e opiniões, o que se vê é justamente o contrário de liberdade.
Há pouco, a grande mídia brasileira foi à OEA denunciar que está sofrendo
processos na Justiça e que esses processos pretenderiam cercear sua liberdade
de imprensa, ou seja, de fazerem acusações gravíssimas a quem quiserem sem
prova nenhuma. Mas quando essa imprensa é acusada de práticas tão graves quanto
aquelas que denuncia, vai à Justiça até contra jornalistas saídos de suas
fileiras por divergirem de sua linha de atuação. Vide o caso Luis Nassif
versus Veja.
Que tal se Nassif (ex-Folha de São Paulo) ou Rodrigo Vianna e Luiz Carlos
Azenha (ex-Globo) fossem à OEA denunciar que, por não aceitarem ver seus
trabalhos jornalísticos deturpados ou bloqueados por seus empregadores, foram
levados a abrir mão de seus empregos, tanto por iniciativa própria quanto
daqueles empregadores? E por que a Veja pode processar Nassif, que é
jornalista, mas quando alguém a processa diz que estão
lhe ameaçando a "liberdade de imprensa"?
O pior de tudo, é que quando quem critica a grande imprensa tenta debater com
ela suas críticas, ela se nega a debater, chegando a insultar os que a
questionam, chamando-os de "descerebrados",
"hidrófobos", "chatos" etc. Processa quem a critica,
mas não admite ser processada por fazer o mesmo ou, pior, por disseminar
campanhas contra isso ou a favor daquilo ou de que isso existe e aquilo não
existe, o que às vezes redunda em desastres como as mortes e adoecimentos
causados por vacinação indevida contra a febre amarela.
Liberdade de expressão ou de recorrer à Justiça tem de ser para
todos. E só será se aqueles que os grandes grupos econômicos que exploram a
comunicação de massas tentam cercear persistirem no exercício do direito de
manifestação e, ainda mais, no de buscarem a Justiça para questionar
esses grupos.
No que diz respeito ao direto de manifestação do pensamento, acho que o Brasil
e o mundo vão muito bem, obrigado. O fenômeno dos blogs e das correntes de
e-mail – e me atenho a eles porque são os meios mais acessíveis
para qualquer pessoa se manifestar em larga escala – vai se intensificando
em progressão geométrica. No questionamento judicial de práticas jornalísticas
claramente danosas, no entanto, o país ainda está engatinhando. À diferença do
que acontece no mundo desenvolvido, denunciar meios de comunicação à Justiça
ainda é um tabu por aqui.
Denunciar, processar ou criticar não é mais prerrogativa exclusiva da mídia.
Liberdade, tampouco. E pretendo provar isso. Essa é a parte que nos cabe, aos
cidadãos comuns, neste latifúndio, neste mundo injusto, desigual,
hipócrita, do qual meia dúzia de magnatas das comunicações querem
aprofundar o "modelo". Por conta disso, como cidadão, como detentor
dos mesmos direitos que têm os Marinho, os Frias ou os Mesquita, não hesitarei
em tomar atitudes, amparado por dezenas e dezenas de brasileiros de todas as
partes do país que se uniram à ONG que propus que fosse fundada, o Movimento
dos Sem-Mídia.
PS: ao fim da segunda-feira, 17 de março de 2008, este blog fará um anúncio
muito importante, que deverá interessar sobremaneira a todos os que vêm aqui
diariamente.
Escrito por Eduardo Guimarães
às 11h08