Aldeia Nagô
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Toda nudez será castigada? Por Neyde Lantyer

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Neyde_Lantyer

Sábado passei uma tarde inteira refletindo sobre nudez. Sempre me acontece qdo vou à sauna aqui na Holanda, mas agora, com a recente onda de puritanismo no Brasil, o pensar foi mais fundo. Em dezembro faz 17 anos da primeira vez q fui à sauna aqui.

É costume local, as pessoas vão para relaxar e, especialmente, p/ amenizar os 7 longos meses de frio, qdo o corpo está sempre coberto por mtas e pesadas vestes. Na sauna e em todas as suas dependências, todos ficam nus.

Há 17 anos falei p/o meu marido que não teria coragem e iria usar bikini, ele disse q então não podíamos ir pq estranho seria uma mulher de bikini em um ambiente em q todos estão nus (o bikini seria um símbolo de vaidade). Desisti do bikini mas me agarrei à minha toalha. Foi uma experiência estranha pq eu nunca tinha ficado sem roupa em um ambiente coletivo, estranha também pq ninguém estava preocupado com a nudez do outro nem com a própria. Estranha p mim, brasileira, pq a nudez era simples, sem subterfúgios, sem exibicionismos, deserotizada. Corpos novos e velhos, gordos e magros, flácidos, barrigudos ou não, peitos, bundas, pintos e xerecas de todos os tipos desfilando para lá e para cá naturalmente, passando de um ambiente a outro simplesmente nus – apenas no restaurante as pessoas usam roupão (nas fotos q ilustram este post as pessoas aparecem c/roupões ou toalhas pq são fotos de publicidade, mas lá todos estão despidos).

De lá pra cá, já fui algumas outras vezes à saunas, spas, centros de relaxamento, uns mais chiques, outros mais básicos, em todos, a nudez é coletiva e absolutamente simples. No sábado fomos à esse spa bonitão no Amsterdamse Bos, um complexo de “wellness” (saúde, bem-estar) com sauna seca, à vapor, quentíssima, perfumada, de luz, de brasas, etc, banhos turcos (os hammas), banhos romanos, uma queda d’água interna de água de chuva gelada, para alternar com a suana mais quente, uma piscina aquecida enorme metade interna (ambiente tbem aquecido) e metade externa (sob o frio do outono ou do inverno), vc passa de uma para a outra nadando (a minha preferida, adoro nadar na água quente a céu aberto), jacuzzis internas e uma enorme do lado de fora, ofurô tbem na parte externa, etc. Todos esses ambientes são compartilhados, nenhum é privativo.

Mas o q mais me toca são os corpos qdo a nudez é deserotizada. Nas primeiras vezes em q estive na sauna fiquei tão impactada q pensei q não achava o corpo humano nu bonito como eu idealizara, hoje entendo q o corpo humano é belíssimo justamente nas suas imperfeições e na sua humanidade. Há uma similaridade em todos eles q é comovente, há sempre uma barriga, uma celulite, uma flacidez, uma parte q não se enquadra no idealizado, mesmo em se tratando dos corpos mais jovens e mais torneados, sem que nada disso seja fraqueza ou defeito. Os corpos nus em um ambiente não sexualizado não são como os corpos da publicidade e muito menos os da pornografia, não despertam atrações irresistíveis, nem vontade de olhar ou tocar. Eles nos lembram nós mesmos, nossos pais e mães, filhos, todos tão vulneráveis, comuns, iguais, mortais, simplórios na sua profunda humanidade.

Meu pensamento estava o tempo todo no Brasil. Vontade de chorar pelo retrocesso, pela exarcebada erotização dos corpos mesmo os infantís, ou os velhos, qdo se exige q permeneçam jovens, pela demonização do nu, pela religiosidade e o puritanismo toscos q se abateram sobre a nossa sociedade doente. Aceitar o nu como a nossa humanidade é o caminho inclusive para a redução dos crimes sexuais contra mulheres e crianças. Nudez é humanidade.

Neyde Lantyer, baiana, é fotógrafa e vive na Holanda há mais de 20 anos.

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