Entre versos, livros, lidas e canções: Capinan ressoa. Por Renato Queiróz
Entre versos, livros, lidas e canções: Capinan ressoa
O nome de José Carlos Capinan ressoa na alma da poesia, da música e da cultura brasileira como um símbolo da riqueza de um país vibrante. Nascido em 19 de fevereiro de 1941, em Entre Rios, Bahia, o destino já pressentia a grandiosidade de sua jornada, registrando-o na cidade de Esplanada. Filho de Osmundo Capinan e Judite Bahiana Capinan, com mais 12 irmãos.
Senta que lá vem História!
Desde a infância, sua vida foi um constante movimento, refletindo uma curiosidade inquieta que Salvador, a cidade para onde se mudou ainda jovem, começaria a testemunhar.
Desde jovem, Capinan demonstrou um talento notável para as artes. Suas letras poéticas e engajadas ressoam com temas de amor, política e identidade cultural. Foi no Instituto Central de Educação Isaías Alves (ICEIA) que Capinan aprimorou os seus primeiros passos na poesia, enquanto cursava no colegial, o curso pedagógico.
Nos efervescentes anos 1960, ao ingressar na Universidade Federal da Bahia (UFBA) para estudar Medicina – onde também, se formou – encontrou no ambiente cultural e artístico seu verdadeiro chamado. O envolvimento com o Centro Popular de Cultura (CPC) da União Nacional dos Estudantes (UNE) e com o Teatro Jovem foi um marco na sua trajetória como poeta e letrista.
“Ponteio”, uma parceria de Capinan com Edu Lobo, é uma das canções mais icônicas do Festival de Música Popular Brasileira de 1967. A canção foi a vencedora do festival, que é lembrado pela alta qualidade das canções e pela revelação de importantes nomes da MPB. Outras músicas notáveis apresentadas foram “Alegria, Alegria” de Caetano Veloso, “Roda Viva” de Chico Buarque e “Domingo no Parque” de Gilberto Gil. “Ponteio” é mais um marco na carreira de Capinan, consolidando sua importância no cenário musical brasileiro.
A década de 1960 marcou a ascensão de José Carlos Capinan como uma figura central no movimento tropicalista. Ao lado de ícones como Caetano Veloso, Gilberto Gil, Tom Zé, Os Mutantes, Torquato Neto, Rogério Duarte, Rogério Duprat, Nara Leão e Gal Costa, ele ajudou a criar uma nova estética musical e cultural, subvertendo normas e desafiando convenções. As palavras de Capinan tornaram-se floretes poéticos desse movimento revolucionário.
José Carlos Capinan colaborou com gigantes da música brasileira como Gilberto Gil, Caetano Veloso, Edu Lobo, Jards Macalé, Paulinho da Viola, Roberto Mendes, Moraes Moreira, João Bosco, Elis Regina, Zeca Baleiro, Maria Bethânia, Gereba, Gracinha Leporace, Geraldo Azevedo, Ederaldo Gentil e Alexandre Leão. Suas letras, que abordam temas como política, amor, religiosidade, vida e resistência, são manifestações poéticas profundas e engajadas.
Entre suas obras destacam-se “Corrida de Jangada”, “Ponteio” e “Cirandeiro”, “Viola Fora de Moda” com Edu Lobo; “Ladainha”, “Soy Loco Por Ti, América”, “Viramundo”, “Misere Nobis” e “Água de Meninos” com Gilberto Gil; “Coração Imprudente”, “Canção para Maria”, “Mais Que a Lei da Gravidade” e “Orgulho” com Paulinho da Viola; “Papel Machê” e “Pirata Azul” com João Bosco. Destacam-se, ainda, “Cidadão” com Moraes Moreira; “Demanda”, “Yáyá Massemba” e “O Nunca Mais” com Roberto Mendes; “Pulsars e Quasars”, “Meu Amor Me Agarra e Geme e Treme e Chora e Mata” e “Gotham City” com Jards Macalé; “Última Mentira” com Fagner; “Ifá” com Cézar Mendes; “Moça Bonita” com Geraldo Azevedo; e “Luandê” com Ederaldo Gentil. Entre tantas e muitas.
Além de sua carreira musical, Capinan se destacou como poeta, escritor, publicitário e teatrólogo. Coeditor da revista “Anima”, ele participou de várias antologias poéticas, estendendo sua criatividade para além das melodias e harmonias. Capinan publicou diversos livros de poesia, ensaio e ficção, como “Inquisitorial”, “Poemas: Antologia e Inéditos”, “Balança, mas Hai-Kai”, “Estrela do Norte, Adeus”, e “Signo de Navegação Bahia e Gente”.
“Vinte Canções de Amor e Um Poema Quase Desesperado” é um livro fascinante onde José Carlos Capinan, além de publicar a letra de vinte de suas composições conhecidas, descreve o processo de criação delas em depoimentos emocionantes. O livro também inclui a publicação completa do poema ecológico “Uma Canção de Amor às Árvores Desesperadas”.
Na esfera pública, exerceu o cargo de secretário da Cultura da Bahia durante o governo de Waldir Pires (1987-1989), posição em que pôde imprimir sua visão cultural em políticas e ações significativas.
José Carlos Capinan também deixou sua marca no Museu Nacional da Cultura Afro-Brasileira (MUNCAB), em Salvador, onde atuou como presidente de honra. O MUNCAB, inaugurado em 19 de novembro de 2009, tornou-se um centro vital para a preservação, produção e difusão da cultura afro-brasileira e diaspórica nas Américas. Mesmo após um fechamento temporário em 2020, o museu reabriu em 2023, continuando a promover exposições, oficinas e eventos educativos que celebram a influência africana na cultura brasileira, além de realizar ações intercambiais com países africanos como Angola, Moçambique e Guiné.
Capinan também foi presidente da Associação de Amigos da Cultura Afro-Brasileira (Amafro). Em 13 de setembro de 2024, ele recebeu o título de Doutor Honoris Causa pela Universidade Federal da Bahia (UFBA), em uma cerimônia realizada no Salão Nobre da Reitoria da UFBA, no bairro do Canela, que contou com a presença de familiares, amigos, artistas baianos e membros da comunidade. Durante a cerimônia, Capinan se emocionou ao receber o título e destacou a influência da UFBA em sua trajetória artística e cultural.
Agradecemos a José Carlos Capinan por cada verso, suor, palavra e gesto que generosamente nos presenteou. Sua história desafia o tempo e permanece viva em nossas almas, revelando autenticidade e devoção à arte. Suas palavras transcendem gerações e continuam a nos mover, celebrando a riqueza da música, da poesia, da memória, da resistência e da cultura.
José Carlos Capinan é membro da Academia de Letras da Bahia Eleito em 16 de novembro de 2005, tomou posse em 17 de agosto de 2006. Capinan certa vez expressou seus sentimentos sobre sua trajetória de maneira inspiradora e ressoa:
“Nunca me imaginei capaz dessa trajetória, fui fazendo, atravessando o tempo com parceiros, e acabou acontecendo. Criar é uma espécie de potência, um tesão pelo belo, divertida forma de se entender a vida, de compreender o humano. E a natureza do mundo, às vezes tão difícil que só pela arte se pode chegar perto do seu sentido”, destacou o poeta. “A vida entendida na sua verdadeira dimensão nos obriga a um gesto humilde de celebrá-la. Nada consegue reduzi-la, devemos nos render à sua grandeza e mistério, celebrando, agradecendo e abraçando-a.”
Aqui: “Te esperei” recitada por Capinan, com violão de Gerado Azevedo. De José Carlos Capinan. Som original extraído do vinil “Capinan, o viramundo”, que comemorava os 21 anos do tropicalismo, de 1988.
Capinan é SONZAÇO!
Renato Queiroz é professor, compositor, poeta e um apaixonado pela história da música,.
Professor Renato, parabéns, mais uma vez você premia o(a) leitor(a) com uma aula de história, e resgatando valores e personagens conspícuos e atemporais.
Grato.
Messias Macêdo
Caro Messias, agradeço as suas generosas palavras, sempre, incentivadoras.
Capinan é essencial.
Quis fazer um singela, homenagem. Que bom que você gostou.
Forte abraço
Caro Messias, agradeço as suas generosas palavras, sempre, incentivadoras.
Capinan é essencial.
Quis fazer um singel homenagem. Que bom que você gostou.
Forte abraço