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Tem espaço no trio? Os artistas que podem renovar o Carnaval baiano . Por Luciano Matos

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No rastro do BaianaSystem, nomes como Larissa Luz, ÀttooxxÁ, IFÁ, Afrocidade, FunfuDúdú e Telefunksoul estão entre os que tem potencial para fazer um novo Carnaval baiano.

Enquanto os famosos blocos do Carnaval de Salvador insistiam apostando numa renovação de nomes que pouco renderam, uma cena musical à parte, sem grandes recursos ia se consolidando e revelando novos talentos. Diante da crise criativa, de modelo e econômica vivida pela Axé Music, novos caminhos se abrem para uma dezena de artistas independentes que bem que já poderiam estar fazendo um outra festa nas ruas de Salvador.

Uma alternativa que já pôde ser vista com força com o BaianaSystem nos últimos anos. De patinho feio, desprezado quando passava no circuito oficial da festa, o grupo se transformou em fenômeno na capital baiana e vem se consolidando como força nacional. Do mesmo universo da banda, vários outros nomes aparecem com potencial para invadir às ruas. Opções não faltam.

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Um desses novos talentos que se apresenta com grande potencial é a IFÁ. Com nome tirado das iniciais Ijexá, Funk e Afrobeat, a banda instrumental traz a mescla de ritmos em sua essência, unindo as três sonoridades de origem africana. O grupo agora pretende mergulhar ainda mais na cultura local, num trabalho com as músicas e ritmos dos tradicionais blocos afro e afoxés de Salvador. Com shows sempre cheios e regados a muita dança e posicionamento político, a IFÁ já vai experimentar nas apresentações de verão a nova proposta com versões de composições do Olodum, Ilê Aiyê, Filhos de Gandhy e Badauê. “O trabalho deles é o que tem o link mais direto com o afrobeat de Fela Kuti, mesmo que nunca tenha se falado nisso”, explica Atila Santana, guitarrista do grupo. A ideia é levar essa sonoridade para cima do trio, mas esse ano, mas não vai ser em 2018, já que a banda não acertou participação na festa.

Quem já tem experiência com trio elétrico no carnaval de Salvador é a Orkestra Rumpilezz. Liderada pelo ex-músico de Ivete Sangalo, o maestro Letieres Leite, e uma formação com cinco músicos de percussão e 14 de sopros, a orquestra levou os ritmos afros mesclados ao jazz para as ruas em um trio construído com dimensões mais próximas do público. O Jaztrio, como foi batizado, é mais baixo e com um cuidado maior no volume, mas corre o risco de não participar da festa de 2018 por falta de patrocínio. Assim mesmo, já demonstrou em anos anteriores ser uma das interessantes propostas de um novo carnaval. Sempre entoado por uma música percussiva baiana menos comum, o repertório gira pelas composições do grupo e por versões de Gilberto Gil, Lenine e Beatles, e conta ainda com reforço de cantores convidados.

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Presença feminina
– A tradição das mulheres baianas puxando trio elétrico pode ser mantida com nomes como Larissa Luz, Márcia Castro e Livia Nery, agora com cunho ainda mais autoral, já que elas também são compositoras de parte de suas músicas. A primeira já teve uma experiência cantando no Ara Ketu, mas há alguns anos dedica sua carreira a um trabalho solo, no qual faz uma fusão rítmica, com sonoridades afros-baianas unidas a rap, dubstep, trap. Tem como trunfo também o discurso, com letras que tratam do empoderamento negro e feminino, e as perfomances com coreografias e dançarinas. Esse ano ela tem agenda cheia na festa: mais uma vez vai puxar o Trio Respeita as Mina, ao lado de Pitty e Karina Buhr; faz show em um camarote gratuito na Barra, divide um trio com Emicida e Baco Exu do Blues, além de participar do Carnaval de Recife, no festival  Rec Beat.

Márcia Castro já puxou trio elétrico algumas vezes, fez durante anos um ensaio durante o verão e agora e tem voltado sua música para o que denominou de eletropop baiano. Uma sonoridade menos calcada na MPB, com mais groove, beats, graves e rebolado e totalmente sintonizado com os novos tempos. A proposta junta referências do BaianaSystem e do novo pagode eletrônico baiano com funk, kuduro e a música pop mundial. Márcia estará no Furdunço esse ano. Lívia Néry é a mais nova e tateia ainda os caminhos que deve seguir, mas já cantou no trio do Baiana e tem tornado seu trabalho mais dançante, com sons oitentistas, música jamaicana e eletrônica.

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Larissa Luz com BaianaSystem no Carnaval de 2013 – Foto Rafael Flores

Bahia Jamaica – No rastro do BaianaSystem, outros nomes fazem uma junção de ritmos baianos, música jamaicana e referências pop de outras partes do mundo. É o caso do Afrocidade, da cidade industrial de Camaçari, vizinha a Salvador. O grupo mescla ritmos populares como arrocha e pagode, com música afro, dub jamaicano, reggae, ragga e afrobeat. Dois aspectos importantes presentes no trabalho do grupo são as letras politizadas e um grupo de dançarinos. A escola dos sound system na Bahia também apresenta outros nomes que se encaixariam na festa, com sons dançantes e que mistura essencialmente dancehall, ragga, dub e ritmos baianos, os dois melhores exemplos são Ministereo Público, de Salvador, de onde surgiu Russo Passapusso, e o Roça Sound, de Feira de Santana.

Há ainda o OQuadro, grupo de rap que mescla sua música com sonoridades diversas como afrobeat, afoxé, funk e ragga. Além do chamado movimento Bahia Brass, com nomes como os DJs Telefunksoul e Lord Breu, que juntam eletrônica com vários ritmos baianos tradicionais, como afoxé, samba de roda e o samba-reggae, e reconfiguram tudo sinteticamente, inserindo samples, loops e beats. As misturas rítmicas são marcas também do Radiomundi, um projeto que conecta música orgânica e eletrônica, transitando por afrobeat, dub jamaicano e samba.

Àttooxxá - Foto Antônio-Chequer

Àttooxxá – Foto Antônio-Chequer

Neo Pagode – O mais popular dos ritmos baianos atualmente, o pagode deve continuar forte nos próximos anos, mas pode ganhar novos rumos com uma turma que tem injetado outras sonoridades à quebradeira. Autor e produtor de um dos hits do Carnaval 2018, ‘Elas Gostam (Popa da bunda)’, o grupo ÀttooxxÁ ainda não encarou liderar um trio elétrico, mas pelo sucesso dos ensaios e festas que vem promovendo nos últimos meses tem muito potencial para tanto. No Carnaval 2018, já estão confirmado no Furdunço e num palco na Praça Castro Alves. Grande novidade deste verão, o grupo pega o tradicional pagode local e transforma em uma quebradeira com beats, sinths e muito groove. Esse pagode carregado de eletrônica pode ser ouvido em outros nomes, como o DJ Som Peba, que adiciona também funk e arrocha ao tempero. Tem até orquestra pegando o ritmo e misturando com música erudita. Desde 2009, a Sanbone Pagode Orquestra faz essa mistura, com seus 25 integrantes divididos em naipes de trompete, trombone, saxofone, percussão e harmonia. O repertório é totalmente composto por sinfonias de pagode.

O grupo Funfun Dúdú também tem o erudito na raiz. Seus integrantes são professores da Escola de Música da Ufba, sendo dois doutores em composição e regência e um mestre em música. Eles aproveitam essa base acadêmica para transformar composições de jazz em ritmos populares, como uma música de Charlie Parker que virou um arrocha, ou um reggae de Lyn Taitt que foi transformado num pagodão. Com nome tirado do iorubá e que significa as cores branca e preta, o grupo faz música instrumental e também tem composições próprias que passeiam por jazz, afrobeat, samba reggae, arrocha e pagode. Segundo eles, a ideia é fazer como no começo do século 20, quando o jazz norte americano era para dançar. “O que fazemos é a mesma coisa, uma música instrumental para se dançar, só que com a nossa cultural e contexto sócio­cultural”, afirma Pedro Filho, guitarrista do grupo. Sobre unir erudito e popular, ele é taxativo: “A barreira é mais ideológica do que musical, não tem nada nos ritmos nem nos sons que impeçam que esses universos se misturem, se influenciem mutuamente”.

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Força percussiva – Um dos elementos mais marcantes do Carnaval baiano é a percussão, especialmente o oriundo dos blocos Afro, matriz responsável por boa parte da produção a partir dos anos 80. Os tradicionais blocos ainda possuem importância e seguem apresentando novidades. Alguns mais novos buscam caminhos mais sintonizados com a música contemporânea. É o caso do Cortejo Afro, que busca se diferenciar inserindo batidas eletrônicas e pop em sua massa percussiva, sem abandonar a estética afro-descendente. Seguindo com foco na tradição da percussão, há grupos como Mamah Soares & Coletivo di Tambor, que mescla as batidas do ijexá, samba e hip hop, ou o BA_co, que faz uma revisita e propõe um novo olhar ao samba reggae. Há ainda o Africania, grupo de Feira de Santana, que mantém a sacralidade da cultura afro-brasileira, com força na percussão e influências do afro-jazz, da música caribenha e do acid-rock.

Antigos carnavais – Os tradicionais carnavais também vêm sendo preservado por grupos como o Bailinho de Quinta, especializado em revigorar as antigas marchinhas. O grupo também inclui clássicos da festa na Bahia em seu repertório, com músicas de Caetano Veloso e Moraes Moreira, além de criar versões para pérolas do rock, como ‘Miserlou’, de Dick Dale, conhecida pelo filme Pulp Fiction, e ‘Seven Nation Army’, do White Stripes. Outro numa linha parecida é o Retrofolia, a versão carnavalesca da banda Retrofoguetes. Eles já puxaram um pequeno trio elétrico mostrando versões instrumentais de clássicos do Carnaval baiano, com uma forte predileção por composições do trio Armandinho, Dodô & Osmar. Assim como o Microtrio, capitaneado por Ivan Huol e já veterano na festa.

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Até a Axé Music mais clássica, lá das origens, tem seu espaço com novos nomes como a banda Suinga. O grupo volta aos anos 80 para criar uma sonoridade que remete aos primórdios da explosão do carnaval baiano, com galope, frevo elétrico e samba reggae. Algo parecido faz outra banda, a Vitrola Baiana, que injeta ainda maracatu e pagode na mistura.

São artistas, em geral, ainda pouco conhecidos do grande público, que propõem novos ritmos, misturas, eletrônica e tradição se cruzando e muita criatividade. Daqui a dez ou vinte anos, talvez sejam estas as características da música baiana ouvida nos carnavais. Alguns desses nomes já são realidade no Carnaval, se apresentando nos bairros da capital baiana, em palcos paralelos no circuito da festa, no Carnaval do Pelourinho ou em projetos como o Furdunço. Uma coisa não deixa dúvidas, por mais que haja uma crise na Axé Music e no formato da festa soteropolitana, diversos caminhos e novos talentos já despontam com potencial para dar uma nova cara a festa mais popular da Bahia.

Matéria de autoria de Luciano Matos publicada originalmente para UOL.


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