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Você é a favor do impeachment da presidenta Dilma? Por Amanda Cunha

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Considero todo esse processo político atual, que culminou da tramitação do impeachment da presidenta Dilma, um golpe contra a democracia no Brasil. Penso que as ondas de protesto em 2013 são um ensaio disso tudo.

Uma massa de gente descontente com a política foi às ruas nesse período, manifestações que negavam bandeiras de partidos políticos e de movimentos sociais, que se organizavam por meio das redes sociais, formadas, principalmente, por pessoas que não participavam de nenhum espaço político no cotidiano e que não tinham pautas específicas nem muito claras nas ruas, demonstravam insatisfações políticas e pediam mais saúde, educação, transporte público acessível e de qualidade, mas que não propunham vias, não questionavam projetos de lei que iam de encontro a esses desejos, nem questionavam as contradições estruturais do Estado e das instituições brasileiras, foram tomadas como formato das atuais manifestação contra o governo e o PT.

O processo eleitoral conturbado de 2014, onde ali, já se organizava com certa clareza, a organização de um campo político de oposição formado pela figura do Aécio Neves, representante de um pensamento empresarial e liberal do país, Marina Silva, que organiza em torno de si, os insatisfeitos com a política, Levy Fidelix e Pastor Everaldo, que representam uma oposição raivosa e pensamentos mais conservadores na política.

Esse cenário já desenhava o que estava por vir, um processo político marcado por uma forte polarização, com pouco debate de ideias e mais ataques pessoais e um forte caráter misógino que colocou a presidenta Dilma de forma, muitas vezes violentas, no centro das insatisfações políticas no Brasil. Após o processo eleitoral, essa nova frente de oposição passou a impor no Congresso, a agenda derrotada nas eleições numa tentativa de construir uma narrativa que aprofundasse a crise econômica e social, desgastasse o governo e legitimasse um processo de impeachment. Todo esse processo foi apoiado pelos grupos que controlam os meios de comunicação no Brasil.

É importante lembrar que o primeiro documento público da Operação Lava-jato, a extensa “lista de Janot”, apresentava apenas 7 deputados federais do PT e 1 senador, dos mais de 60 nomes de parlamentares investigados. O fato é, que a partir daí, a operação passou a ser uma investigação que conseguisse provar qualquer indício que comprovasse a participação ou conhecimento da presidenta Dilma e do ex-presidente Lula, sepultando, quase que completamente, as demais figuras envolvidas nesse processo. Os caminhos da operação viraram uma grande apoteose de escândalos, onde a mídia teve um papel fundamental de construir no imaginário coletivo, a ideia de justiça X governo.

Esse processo político altamente judicializado foi marcado por diversos erros, escândalos e até crimes contra a segurança nacional, nos casos dos sucessivos vazamentos de informações sigilosas, grampos ilegais e publicidade de áudios envolvendo a presidência da República, tudo transformado em transmissão legítima e natural de informações.

O que mais me deixa constrangida como cidadã brasileira é o fato de um permanecer parlamentar, um réu julgado por unanimidade pelo STF, com diversas denúncias de desvios de dinheiro público, quebra de decoro, e mais recentemente, as denúncias do Panamá Papers, que denunciou diversos políticos e empresários brasileiros que mantém offshors para lavagem de dinheiro fora do Brasil, que nem chegaram a virar notícias massificadas nos principais meios de comunicação.

Assim como a Operação Zelots, Eduardo Cunha e a sua ficha corrida parecem cair no esquecimento. Como legitimar ou conceber como natural um processo de impeachment conduzido por esta figura e votado por parlamentares envolvidos em todos esses escândalos de corrupção?

As “pedaladas fiscais”, esquecidas anteriormente por ser um argumento fraco, despontou, então como o principal argumento do golpe, já que a corrupção, foi escancarada como algo sistêmico, fruto do próprio sistema político eleitoral.

O TCU já aprovou as contas do governo Dilma, o TSE já julgou as doações da campanha, as chamadas pedaladas fiscais já se tornou um mecanismo de gestão do Estado, utilizado, pelo mínimo, 16 governadores em exercícios e por todos os presidentes anteriores, então, como não compreender esse processo como um golpe nocivo que trazendo o PMDB para assumir o governo, deixa mulheres, negros e negras, jovens, povos tradicionais e a classe trabalhadora refém de uma agenda de austeridade?

Para mim, isso não passa do golpe da contrarreforma do Estado brasileiro, assim como 1964 foi o marco da nossa contrarrevolução.

Amanda Cunha — militante da Marcha Mundial de Mulheres

Artigo publicado originalmente em http://www.aratuonline.com.br/noticias/opiniao-contra-o-impeachment-isso-nao-passa-do-golpe-da-contrarreforma-do-estado-brasileiro-diz-amanda-cunha-militante-da-marcha-das-mulheres/

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