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Quem disse que dinheiro não é capim? Por Malu Fontes
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Ter, 18 de Abril de 2017 17:38

Malu_Fontes2Há uma máxima popular, usada quando queremos desqualificar o caráter de uma pessoa, que diz: "fulano não vale nada. É tão canalha que quando se vendia gente ele era usado como troco".

Depois da divulgação das 271 horas de depoimentos em vídeo dos 77 executivos delatores da empreiteira Odebrecht, o Brasil inteiro parece ter levado uma voadora no meio da cara, foi a nocaute e acordou convencido de que, por aqui, a compra e a venda de gente vinha sendo a norma, não a exceção. E, diferentemente da piadinha, quanto menor o caráter dos vendidos, mais longe de serem troco estavam.

O Brasil nunca foi para principiantes, desde Cabral, o primevo navegador desses costados, não o carioca viciado em joias, e, portanto, todo mundo sabia que essas entidades políticas, de prefeitos e vereadores dos menores municípios brasileiros aos mais altos escalões da Presidência da República, sempre falaram outra língua e raramente têm em mente algo em comum com o desejo de quem, de fato, precisa do apoio político para sair do chão sócio-econômico, o povo. No entanto, o que a Odebrecht revelou foi algo de uma magnitude tal que atirou palavras como eleições e mandatos para um nível de excrescência que ultrapassou o pornográfico. Há  décadas a empresa comprava gente, de índios a milicianos, passando pelos escroques clássicos aos príncipes do caciquismo político nacional e até internacional. Comprava, pagava e dava a todo mundo o dever de casa. Os vendidos botavam preço e cumpriam as ordens de serviço da empreiteira baiana, tornando esse toma lá da cá uma operação que chegou a 3,3 bilhões de dólares em oito anos (mais de R$ 10 bilhões).

As consequências do desfecho dessa compra de gente sem sequer discutir preço estão se escancarando nas ruas e na vida dos brasileiros. Beira o surrealismo o quão longe foi a elite política e econômica brasileira para viabilizar interesses privados. Ainda faltam outras empreiteiras desfilarem na TV contando quanto, como e com quem desembolsaram, mas será impossível, até por serem de menor porte, superar o que se soube até aqui pelas bocas da própria Odebrecht. Não ficou pedra sobre pedra, embora ainda haja gente saindo pelo ladrão vociferando em casa, na rua e nas redes sociais em nome de sua facção política de estimação, elegendo seus inocentes e culpados favoritos, colocando todo o conteúdo do esgoto na conta exclusiva dos Odebrecht, da mídia golpista tendenciosa, do Fla e do Flu, quando, na verdade, está mais concreto que as pirâmides egípcias que nessa república do compadrio não há lugar para inocentes. Inocência quanto à política brasileira de hoje é cegueira, má-fé ou indigência cognitiva. A regra está clara: o povo votava em um candidato e quem se elegia, governava e fazia leis era a iniciativa privada.

Até os mortos que invocavam a tal da nova política estavam com os olhos arianos remelados de lodo do propinoduto. Nem os cavalos do Jockey Club do Rio de Janeiro escaparam da cumplicidade no esquema de corrupção. Era tão grande a quantia e o volume de dinheiro ilegal para carregar para lá e pra cá que um dos executivos delatores usou a baia de um dos seus cavalos no Jockey para esconder milhões. Nunca na história do mundo a expressão "dinheiro não é capim" soou tão burra. O Brasil atingiu um nível de expertise tão inimaginável, em termos de escala, que dinheiro e capim podem ser sinônimos e ocupar o mesmo espaço físico, sim.

No final das contas, já que é preciso escolher entre provar que se tem algum neurônio ou continuar defendendo a inocência de A ou B, resta a opção de selecionarmos quais das falas da "Delação do Fim do Mundo" merecem ir para o top of five. Aposto em três. O momento em que Emílio Odebrecht fala ao procurador que lhe toma o depoimento, observado por seu advogado, que sempre o olha de soslaio, com um sorriso contido de Mona Lisa, mão sobre as sobrancelhas, numa pose de psicógrafo, e reitera a definição que o general Golbery do Couto e Silva, um dos nomes mais importantes da ditadura, deu a Lula: "O Lula não tem nada de esquerda. Ele é um bon vivant. É verdade". Nenhum petista raiz será capaz de conviver com essa tradução "nutela" do ídolo sindicalista.

A outra, quando o executivo Hilberto Mascarenhas faz uma associação entre os médicos e os marqueteiros, considerando-os as piores "figuras" para se tratar: "eles não têm raciocínio financeiro. Duda [Mendonça] tinha um dinheiro para receber da campanha de Skaf [Paulo, candidato ao Governo de São Paulo em 2014, pelo PMDB]. Queria um apartamento. Isso não existe. Como é que eu compro um apartamento, boto no ativo da empresa e depois lhe transfiro a custo de quê?" Como os médicos foram parar nessa citação, eles vão querer saber. E, finalmente, o trecho em que o promotor Sérgio Bruno, em tom de reprimenda, diz a Emílio: "São 300 milhões que foram gastos sei lá com o quê, seja com campanha, com santinho, com tempo de televisão, com marqueteiro, que podiam ter construído escola, hospital e todo esse Brasil que o senhor sonha e quer viver. Esse dinheiro poderia estar lá. Então, vamos agora deixar de historinha". Só parece difícil acreditar que um dia Emílio sonhou com ou quis viver em um Brasil com educação e saúde como o aludido por Bruno. Ninguém sonha com coisas das quais não sente falta.

*Malu Fontes é jornalista e professora de jornalismo da Facom-UFBA.

Artigo publicado originalmente em http://www.correio24horas.com.br/detalhe/malu-fontes/noticia/malu-fontes-quem-disse-que-dinheiro-nao-e-capim/?cHash=137ad88d4b1f113721ae436889e7687c

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