A massa se move politicamente no Brasil em função de julgamentos morais sobre os políticos e a política. A sociedade civil organizada e a galera mais cascuda na militância política se movem em função de ideologia.
Os que, de fato, contam (atores do sistema político e do sistema econômico, elite do jornalismo) se movem em função das políticas públicas que preferem ver implementadas ou das políticas públicas que preferem evitar. É por isso que - enquanto você ataca o seu primo coxinha e esculhamba aquela tia petralha na disputa sobre quem inventou a corrupção, quem é o mais corrupto e quem tem ou não corrupto de estimação, - enquanto movimentos sociais tradicionais envergam bandeiras e faixas, fazem piquetes e ocupações e saem no braço com a polícia "contra o governo neoliberal que está aí", - "os que realmente importam" passaram por cima de miudezas democráticas, princípios e valores constitucionais, bem como ignoram moralidades e moralismos políticos que convulsionam o país, tudo isso para evitar que uma agenda de políticas públicas continuasse por um novo ciclo de 4 anos e para implantar "as reformas de que o país precisa". Ao contrário do que pensam os que acreditam que política é furor ético e indignação, ninguém jamais amou Temer: ele era apenas a melhor solução possível no momento para a situação econômica e política a que Dilma tinha levado o país. Ponto. Estão desistindo de Temer com pesar, porque sabem que ele perdeu a legitimidade política para aprovar e implantar as políticas públicas que desejam. Os moralistas de esquerda devem estar de alma lavada, neste momento, uma vez que Aécio, que começou isso tudo, e Temer, o traíra e beneficiário maior do oportunismo político, estão caindo. Os moralistas de direita pensam em como impedir que Lula volte com o "Diretas Já" e cogitam Bolsonaro, o último sujeito honesto da República. Os ideologistas celebram o esfacelamento deste "governo de direita". Os que realmente têm poder para influenciar ou para realizar, por sua vez, caíram em depressão, uma vez que, na verdade, não têm um plano B para levar a termo as reformas que desejam no cenário pós-Temer, enquanto a dívida interna está a sufocar a economia. E se você pensa que a velha narrativa "povo versus elite" é bastante para dizer que o Brasil que realmente importa é composto pelos dois primeiros grupos, sinto ser eu a lhe dizer que está redondamente enganado. O enigma Brasil está longe de ser resolvido e uma saída para a crise parece cada vez mais distante. Sinto muito. Só com moralismo político não se faz um país.
Wilson Gomes é professor da FACOM/UFBA |