A Colombina, o Faraó e o Carnaval – um jogo de memória. Por Renato Queiróz
O Carnaval é como um jogo de memória que nunca acaba, onde o passado, presente e futuro se misturam em uma dança cheia de emoções. Com os ritmos, as melodias e as harmonias, cada nota, cada acorde, todas as cores e luzes evocando histórias que atravessam o tempo.
Senta que lá vem História!
O Carnaval transforma as ruas em um palco vibrante, onde rostos e máscaras evocam sorrisos e lembranças de carnavais passados. É um momento de viver intensamente, misturando nostalgia e euforia em um mosaico único de emoções.
No Carnaval da Bahia, especialmente em Salvador, a música desempenha um papel central, entrelaçando deuses, divindades e pessoas em uma trama que revela a alma da festa. As canções e gestos carregam a essência de um povo que vive e respira Carnaval, deixando uma marca inapagável na história e na cultura.
E, no futuro, à medida que novas gerações se conectam com essa celebração, a música continuará a ser o fio condutor que manterá viva a tradição e renovará a energia do carnaval baiano, a exemplo de fenômenos espetaculares e magnânimos como o BaianaSystem, que transcende limites ao unir inovação e tradição com sua força musical.
E é para essa marca única que criamos, com carinho e satisfação, um singelo tributo, numa lista a ser amada por muitos e completada por outros.
Agora a nave mãe vai decolar e eu quero é botar meu bloco na rua! Lembranças podem não trazer o nome da música, mas versos embriagados, e nascem da vivência individual e da celebração coletiva, marcando corações e momentos. Afinal, é carnaval cidade!
Hinos como “Chame Gente”, “Atrás do Trio Elétrico” e “Bota pra Ferver” resgatam memórias e criam momentos inesquecíveis.
“Faraó”, em capela, logo no início, é envolvente, um fenômeno uníssono:
— Eu falei Faraóóóóó?!
— Êh, Faraó!
O mundo inteiro parece responder. E depois cantar a sua letra infinita…
É a energia de “Somos Carnaval”, “Poeira” e “Eu Sou Camaleão” que move multidões, enquanto “A Namorada”, “Toda Menina Baiana”, “Rapunzel” e “Tieta” trazem magia, romance e sensualidade. Clássicos como “Prefixo de Verão”, “Vermelho” e “Baianidade Nagô” celebram a cultura, enquanto “Eu Sou Negão”, “Lucro” e “Protesto Olodum” simbolizam luta e conscientização.
Músicas como “Minha Pequena Eva”, “Mila” e “Eu Queria Ser uma Abelha” ecoam diversidade e amor. “Voa, Voa” e “Foi Sem Querer” misturam leveza e emoção, enquanto “Ah, Que Bom, Você Chegou” e “Nessa Cidade Todo Mundo é d’Oxum” celebram a festa.
“Já Pintou Verão”, “Bahia Minha Preta”, “Salve Salvador”, “Da Sé ao Campo-Grande” e “Somos Criolo Doido” refletem o orgulho e a diversidade do povo baiano. A riqueza cultural brilha em “Os mais belos dos Belos”, “Moço Lindo do Badauê”, “Olodum Negro Elite” e “África, Iô Iô”. Mesmo sob “A Chuva Tá Caindo”, o espírito do Carnaval permanece forte, como um poema sem regras, um canto pulsante.
No amor, “Não Precisa Mudar” e “Amor de Carnaval” trazem ternura, e na despedida, “Eu Fui Embora, Meu Amor Chorou” expressa saudade e nostalgia.
A música no Carnaval da Bahia é o pulsar do coração da festa, refletindo alegria, paixão e diversidade que tornam o Carnaval baiano único. Entre tantos hinos icônicos, há uma canção quase esquecida, apesar de ser o hino oficial do Carnaval de Salvador: “Colombina”, de Armando Sá e Miguel Brito.
A narrativa de “Colombina” é uma das mais clássicas do Carnaval, cheia de simbolismo. A marchinha retrata Pierrot, um personagem triste e sonhador, apaixonado por Colombina, que, esperançosa e flertadora, prefere Arlequim. Originados na Commedia dell’arte do século XVI, esses personagens italianos tornaram-se ícones da cultura popular, especialmente carnavalesca.
No Brasil, Pierrot e Colombina foram incorporados ao Carnaval, representando a dualidade entre alegria e tristeza. Essa história inspirou artistas em várias formas de arte e segue viva nas fantasias que simbolizam a festa nas mudanças culturais sem perder a essência clássica.
A canção “Colombina” foi gravada em 1957 e oficializada como hino do Carnaval baiano por decreto em 1970. Interpretada por bandas de sopro em eventos tradicionais como a Lavagem do Bonfim, a Festa de Iemanjá e o Desfile do 2 de Julho, na Fonte Nova ou no Barradão, sua melodia encantadora, letra evocativa e marcha alegre capturam as celebrações carnavalescas.
“Colombina” permanece um marco na história do Carnaval baiano, representando uma era de ouro da música carnavalesca. Durante décadas, um papel importante na cena carnavalesca da cidade eram os carnavais de clubes.
Nos clubes como o Clube Bahiano de Tênis, o Yacht Club, os famosos Clube Fantoches da Euterpe e o Clube Cruz Vermelha, por exemplo, as festas de Carnaval eram eventos luxuosos e desempenharam um papel histórico importante na celebração do carnaval na cidade.
Nesses clubes, “Colombina”, um sucesso absoluto nas ruas, foi oficializada como hino do Carnaval baiano em 1970.
“Colombina” deriva a essência da festa carnavalesca, trazendo à tona a nostalgia e a saudade de um amor frequentemente não correspondido.
Em todos os tempos e lugares, as canções do Carnaval ecoam pela boca do povo. Marchinhas, sambas, galopes, frevos, axés e outros ritmos contemporâneos se misturam, criando uma trilha sonora multifacetada e democrática: um grande palco onde todos podem ser protagonistas.
Nesta quarta-feira de cinzas, de memória, uma palavra para definir o Carnaval: saudade!
SONZAÇO!
Renato Queiroz é professor, compositor, poeta e um apaixonado pela história da música,.
Há muito tempo não lia um texto a respeito do carnaval baiano, narrado com tanto conhecimento, sensibilidade e bom gosto. Parabéns, Renato.
Poxa, meu querido vindo de você um compositor e poeta que sou muito fã e admirador, me serve de muita motivação. Agradeço suas generosas palavras, Gilton!
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