O Gigante Gentil – com suas letras, melodias e histórias. Por Renato Queiróz
Erasmo Esteves, conhecido artisticamente como Erasmo Carlos, nasceu na cidade do Rio de Janeiro em 5 de junho de 1941. Também conhecido como “O Tremendão” e “O Gigante Gentil,” Erasmo foi um cantor, compositor, ator e músico brasileiro. Pioneiro do rock no Brasil e ícone da Jovem Guarda, ele estabeleceu, junto com Roberto Carlos, uma das parcerias mais prolíficas e históricas da música brasileira.
Senta que lá vem História!
A partir de 2001, Erasmo Carlos expandiu seu repertório com discos colaborativos ao lado de diversos artistas, incluindo Marisa Monte, Adriana Calcanhotto, Caetano Veloso, Arnaldo Antunes, Emicida, Nando Reis e Nelson Motta. Em mais de sessenta anos de carreira, Erasmo compôs mais de 750 canções, muitas delas em parceria com Roberto Carlos, além de outros colaboradores. Um compositor de muitos e muitos sucessos.
Erasmo Esteves adotou o nome artístico ‘Carlos’ em homenagem a Roberto Carlos e ao produtor musical Carlos Imperial. Nascido na Tijuca, ele conheceu Sebastião Rodrigues Maia, O Tião, na infância, mas a amizade se solidificou na adolescência devido ao gosto comum pelo rock and roll.
Em 1957, Tião formou a banda The Sputniks com Erasmo, Arlênio Lívio, Wellington Oliveira e Roberto Carlos. Após uma briga entre Tião e Roberto, o grupo se desfez. Tião adotou o nome artístico Tim Maia e cada um seguiu novos caminhos, guiados por Carlos Imperial, o “agitador cultural.”
Foi no Sputniks que Roberto e Erasmo descobriram afinidades musicais, com Erasmo se destacando como intérprete e tradutor de Elvis Presley. Roberto e Erasmo também compartilhavam o gosto por Bob Nelson, James Dean, Marlon Brando, Marilyn Monroe e o amor pelo Vasco da Gama.
A amizade entre eles se consolidou no programa televisivo “Jovem Guarda,” que estreou em 22 de agosto de 1965 na TV Record, em São Paulo. O programa foi um sucesso estrondoso, criando uma nova linguagem musical e comportamental no Brasil, conectando a juventude brasileira ao fenômeno internacional do rock, especialmente influenciado pelos Beatles. Dessa época, destacam-se álbuns como “A Pescaria” (1965) e “O Tremendão” (1967) na discografia de Erasmo.
Mas, tudo passa… Na década de 1970, o Tremendão surgiu com um estilo bem diferente da Jovem Guarda. Influenciado pela cultura hippie e pelo soul, ele lançou “Carlos, Erasmo” em 1971. O disco abre com “De Noite na Cama,” escrita por Caetano Veloso especialmente para ele. Houve polêmica, sendo rotulada e patrulhada – utilizando um termo muito comum naquela época – como um hino à maconha. Acho que muitos viajaram nessa…
“Carlos, Erasmo” é amplamente considerado um dos melhores trabalhos de Erasmo Carlos, sendo um dos mais celebrados de sua carreira. O álbum apresenta gravações de excelência e arranjos instigantes feitos pelo maestro Chiquinho de Moraes. Este disco marcou a estreia de Erasmo na Philips e foi produzido por Manoel Barenbein, Nelson Motta e pelo próprio Erasmo. Para mim, e para muitos, é um dos melhores discos brasileiros de todos os tempos.
Após ganhar o apelido de “Tremendão” e conquistar os corações das garotas, Erasmo passou a apresentar letras mais maduras e reflexivas, explorando temas profundos como casamento, drogas, vida adulta e questões políticas. O álbum “Carlos, Erasmo” é um marco tanto na MPB quanto no rock brasileiro. Este trabalho captura a transição musical da época e consolida o status de Erasmo como um ícone da música brasileira.
O álbum traz uma coleção de músicas que refletem a diversidade e o talento de Erasmo Carlos e seus colaboradores: abre com “De Noite Na Cama,” escrita por Caetano Veloso, seguida de “Masculino Feminino,” de Homero Coutinho Filho. Em parceria com Roberto Carlos, Erasmo apresenta “É Preciso Dar Um Jeito Meu Amigo,” “Gente Aberta,” “Sodoma E Gomorra,” “Mundo Deserto” e “Ciça Cecilia.” A faixa “Dois Animais Na Selva Suja Da Rua” é assinada por Taiguara, e Jorge Ben contribui com “Agora Ninguém Chora Mais.” Vitor Martins e Saulo Nunes compõem “Não Te Quero Santa,” enquanto Fabio e Paulo Imperial colaboram em “Em Busca Das Canções Perdidas Nº2.” A parceria entre Paulo Sergio Valle e Marcos Valle resulta em “26 Anos De Vida Normal.” O álbum é encerrado com “Maria Joana,” outra composição de Roberto Carlos e Erasmo Carlos, completando uma obra marcante na carreira do “Gigante Gentil.”
A música “É Preciso Dar um Jeito, Meu Amigo,” do álbum “Carlos, Erasmo,” além de aparecer nas trilhas sonoras da novela “Amor de Mãe” (2019) da Rede Globo e da série “Outer Banks” (2020) da Netflix, ganhou ainda mais vida ao ser escolhida para a trilha sonora do filme “Ainda Estou Aqui” (2024). Com seu conteúdo metafórico, reflexivo e crítico, essa canção nasceu com raízes profundas em um dos períodos mais sombrios da história brasileira: a Ditadura Militar.
A letra aborda a urgência de ação e mudança através da metáfora de um narrador voltando de uma longa e árdua jornada. Erasmo Carlos, com seu talento único, conseguiu capturar a indignação e o desejo de transformação daquela época. A canção, sem se opor explicitamente ao regime, tornou-se um símbolo de resistência e crítica à ditadura.
Desde seu lançamento, “É Preciso Dar Um Jeito, Meu Amigo” tem sido um farol de reflexão, alertando sobre os perigos de um governo autoritário. A música é um importante instrumento de luta e resistência, destacando a necessidade de encontrar soluções e seguir em frente, mesmo nas adversidades.
Erasmo faleceu no dia 22 de novembro de 2022 devido a uma síndrome edemigênica causada por um desequilíbrio sistêmico, resultando em um edema generalizado agravado por uma infecção. Apesar da dor dos familiares, amigos e milhões de fãs, O Tremendão, O Gigante Gentil, partiu sedado em um sono profundo.
Seu último trabalho foi lançado em outubro de 2022, um mês antes de sua morte. A canção “Nanda,” uma colaboração com Celso Fonseca, é uma homenagem a Fernanda Montenegro. Erasmo, em seu estilo inconfundível, declarou:
— O Brasil precisa de mulheres como Fernanda Montenegro, que sejam exemplo para as outras mulheres. A dignidade e, o discurso, a elegância, a educação… tudo isso unido à excelente atriz que ela é…
Erasmo recebeu o apelido de “O Gigante Gentil” por sua estatura imponente e sua personalidade amável e carismática. Com suas letras, melodias e histórias, ele continua vivo na memória afetiva e cultural do Brasil.
Aqui completo o álbum: Carlos, Erasmo. Ouça sem moderação!
SONZAÇO!
Renato Queiroz é professor, compositor, poeta e um apaixonado pela história da música,.