Um comportamento muito comum em Salvador por Rita Batista
Ricardo Konká, estava reparando um comportamento muito comum em ssa. Primeiro a negação da racismo na capital baiana.
Por acomodação, ou por pura preguiça as pessoas afirmam que não há preconceito/ discriminação aqui por causa da população majoritariamente negra Salvador, terceira cidade mais populosa do país, é formada em sua maioria por afrodescendentes.
Pelos dados do último senso do IBGE, 743.718 se declaram negros e 1.382.543 são pardos. Somados, os números constituem 80% da população de 2,67 milhões de habitantes. Proporção muito acima do total dos brasileiros, em que 50,5% são negros e pardos.
Mesmo assim me deparo com situações no mínimo curiosas: transmito o carnaval de SSA há dez anos, há 4 pela Band. Durante a folia fico hospedada no Othon. São muitas as pulseiras, crachás, credenciais. Uso tudo, não fico me valendo que as pessoas me reconheçam.
Sigo as regras, jogo o jogo. Pois bem, sempre, todo ano, em uma chancela ou outra, entrada ou saída sou barrada e questionada. Isso não acontece com as minhas colegas brancas, que dispensam as pulseiras de identificação para que não haja um comprometimento estético do figurino.
Sem contar as cantadas de todos os porteiros dos bairros nobres, que me ouso andar a pé, não sou a mais gostosa do pedaço, “sou a carne mais barata do mercado”, comigo pode mexer. As cantadas variam das mais baixas e perturbadoras a um educado “bom dia, princesa”. Com as minhas amigas brancas, não há essa permissão, pq os porteiros,vendedores, pedreiros, serventes, policiais e homens que atuam em toda sorte de profissões na rua não ousam falar tais coisas para aquelas que “são filhas da classe dominante”, mesmo que não sejam, mas aparentam ser.
E nessa sociedade imagética o que parece ser se sobrepõe ao que realmente é. Eles não foram “autorizados socialmente” para no exercício do seu trabalho, despejarem todo seu arsenal de macho heteronormativo em cima das meninas que podem ser filhas de seus patrões, mas àquelas que são semelhantes na cor da pele, as que poderiam ser filhas deles já estão acostumadas e segundo alguns, até gostam das investidas deselegantes.
Desde pequena, em todo lugar que chego, olho ao redor e vejo quantos negros há no ambiente e quais as funções que ocupam. Trato de estabelecer uma cumplicidade no olhar, depois um contato físico e um cumprimento olhando no olho e chamando pelo nome- ah, Rita, vc tem que fazer isso com todo mundo- claro!!! E faço!!!
Reforço esse comportamento com quem tem a mesma cor de pele que a minha pq sei, exatamente, o que é viver sob a sombra de mais de 300 anos de escravidão, de ser negligenciado, ignorado, vilipendiado, olhado com desconfiança e temor. Ou mesmo nem ser visto, apesar da sua negritude, motivo de tantos absurdos. Tá puxado, Ricardo, mas vamos remar pra perto do Cais.