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Genoino e a banalidade do mal por Paulo Moreira Leite
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Cidadania
Sáb, 23 de Novembro de 2013 12:08

Paulo_Moreira_Leite2O deputado José Genoíno está experimentando na pele uma situação inacreditável numa democracia. Precisa mobilizar a família, os amigos, as pessoas com alguma consciência social, proteger o bom mais precioso na existência de qualquer pessoa -- o direito à vida.
Em se tratando da saúde de um prisioneiro, a Lei de Execução Penal garante em seu artigo 43 que ele tem o direito de contratar um médico de confiança para “orientar e acompanhar” seu tratamento.

O mesmo artigo prevê que, em caso de divergência entre o médico particular e o médico do Estado, a palavra final cabe ao juiz de execução.

O caso é que Genoíno foi examinado por um médico particular no sábado retrasado, a 1 da madrugada, que concluiu que se trata de um "paciente com doença grave, crônica e agudizada, que necessita de cuidados específicos, medicamentosos e gerais". Seria possível, a partir deste laudo, aceitar o pedido de prisão domiciliar. Mas não. Joaquim Barbosa exigiu um novo exame, feito por peritos do Estado. Estava em seu direito. O resultado foi idêntico. Não havia divergências entre os médicos e mesmo assim foi preciso esperar dois dias, quando Genoíno teve ser levando de ambulância para o Incor, com uma suspeita de infarto que felizmente não se confirmou, para que Joaquim Barbosa assinasse uma mudança para prisão domiciliar ou hospitalar.

Considerando que Genoíno sofre uma doença de caráter permanente, sem esperança de cura além de um tratamento cuidadoso, completo, o caráter provisório contém um sinal político. O diagnóstico médico dificilmente será modificado, como se sabe, a menos que ocorra uma descoberta revolucionária no tratamento.

Fica, então, a ameaça de que o prisioneiro pode ser mandado de volta para a penitenciária a qualquer momento, ainda que, com um tubo de 15 cm implantado para substituir uma parte da aorta, enfrente uma doença que a Sociedade Brasileira de Cardiologia define assim: “as doenças da aorta são patologias com morbi-mortalidade elevada. Tanto o tratamento clínico como o cirúrgico ainda estão relacionados a elevadas taxas de mortalidade, tornando esse grupo de patologias alvo de extrema importância no tópico das patologias graves.”


Ao demonstrar tamanha resistência a acatar aquilo que a legislação determina em caso de doença grave de prisioneiros, Joaquim Barbosa repete, na fase do pós-julgamento, um traço que já fora visto durante toda a ação penal 470.
Mostrou-se, mais uma vez, extremamente rigoroso em tomar medidas duras, que contrariam direitos dos réus, e até impaciente, agressivo, em decisões que irão prejudicá-los. Impediu o desmembramento do julgamento. Fez denúncias agressivas, sem base em provas consistentes. Batalhou para condenar os réus a penas altíssimas, elevadas de modo artificial, como denunciou o ministro Ricardo Lewandovski. Na hora de acatar uma decisão prevista em lei, que irá beneficiar os réus, faz o possível para evitar, atrasar, condicionar, colocar problemas.

O atraso para mudar o regime de prisão não tinha a ver com considerações médicas, mas políticas. Conduzido ao presídio como um dos principais coadjuvantes de uma festa para comemorar o aniversário da proclamação da República, do ponto de vista da encenação Genoíno não podia sair de do palco sem dar a impressão de que alguma coisa não andava bem no enredo.
Precisava alimentar a impressão de que tudo havia mudado no país depois que ele e outros dez brasileiros foram colocados atrás das grades.

O tratamento politizado dos direitos de Genuíno ajuda a questionar a ideia de que é feio, nostálgico e improprio dizer que os condenados da Ação Penal 470 são presos políticos. Alguém ainda pode ter alguma dúvida, quando nem medidas derivadas do conhecimento médico são tratadas com a devida neutralidade e distanciamento?

Num país com um histórico tão lamentável no respeito aos direitos humanos de cidadãos encarcerados, é razoável perguntar qual o interesse de manter a incerteza, o suspense, deixando em cada pessoa a dúvida sobre o que é direito, sobre o certo, sobre o que pode esperar.
Em entrevista ao Brasil 247, o professor Celso Bandeira de Mello, um dos mais respeitados juristas do país, definiu a atuação de Joaquim diante da doença de Genoíno como uma questão de caráter:
"Acho que é mais um problema de maldade. Ele é uma pessoa má. Falo isso sem nenhum preconceito com a pessoa dele pois já o convidei para jantar na minha casa. Mas o que ele faz é simplesmente maldade."
Advogados que estiveram com Joaquim Barbosa para tratar de direitos de prisioneiros também têm uma boa impressão pessoal do ministro. Sem que isso implique em qualquer avaliação sobre as decisões jurídicas do ministro, os relatos descrevem um cidadão de maneiras gentis e educadas, sem nenhum traço da agressividade que se vê no tribunal – e que é coerente com boa parte de suas decisões na ação penal 470.
Eu já tive contatos pessoais com Joaquim, logo depois que ele se tornou relator da ação penal. Minha impressão pessoal é a mesma.
Mas a questão não envolve questões de natureza pessoal.

Estudando a emergência de governos totalitários nas sociedades modernas, Hanna Arendt recorda que a prática do mal, em nosso tempo, exerce “uma atração mórbida” sobre grande parcela da população. Falando dos governantes e autoridades, a professora vai além.
Explica que a “banalidade do mal” é um instrumento político de dominação nas ditaduras, pois permite a autoridades tomar decisões terríveis, sem consideração pelo sofrimento de seus semelhantes, sem se perguntar se elas estão de acordo com seus valores, com sua formação e mesmo com sua história pessoal.
Falando sobre um enforcamento em praça pública, em 1776, época em que as pessoas eram torturadas, esquartejadas e mortas à vista de todos, o jornal inglês Morning Post descreve: “a multidão impiedosa se comportava com uma indecência extremamente desumana – gritando, rindo”.
O mesmo jornal registra um ponto importante no comportamento da “multidão impiedosa.” Esclarece que, em sua “ indecência”, a multidão não se limitava a rir e festejar. Também agredia, jogando bolas de neve, aqueles poucos “que manifestavam uma compaixão apropriada pela desgraça de seus semelhantes.”

Alguém enxerga uma inspiração para comentaristas e observadores que adoram fazer ironias ofensivas diante de quem teve direitos pisoteados e é tratado como cidadão de segunda classe?

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