A caminho do terror econômico, por Paulo Moreira Leite |
Dando o que Falar | |||
Sáb, 21 de Fevereiro de 2015 14:23 | |||
Multa de R$ 4,47 bilhões contra empreiteiras da Lava Jato extrapola qualquer medida jurídica para atingir objetivos políticos, prejudicando o nível do emprego e do crescimento Determinados acontecimentos históricos tem uma reconhecida capacidade de iludir seus contemporâneos. O mais recente envolve a multa de R$ 4,47 bilhões que o Ministério Público pretende aplicar contra seis empresas envolvidas na Operação Lava Jato. O MP também pretende impedir que participem de licitações, que recebam benefícios fiscais e juros subsidiados em seus investimentos. Diante da estatura dessas empresas, entre as maiores do país, estamos falando de propostas que extrapolam o universo jurídico. Não é só. Na sexta-feira, o Ministério Público entrou com uma ação cautelar junto ao Tribunal de Contas da União que pretende impedir a celebração de acordos de leniência entre o governo e as empreiteiras. A preocupação é simples: sem prejudicar as investigações, os acordos de leniência — instrumento jurídico empregado nas democracias mais saudáveis do planeta — tem como finalidade impedir que a atividade econômica de empresas sob suspeita seja inviabilizada pelo trabalho de apuração. O Ministério Público quer prosseguir sua atividade que, mesmo quem imagina que é embalada pelas melhores intenções, sabe que terá um impacto destrutivo sobre o país. Surpresa? Nem tanto. Quem não esqueceu que a operação Mãos Limpas italiana é o roteiro de trabalho da Lava Jato, como o juiz Sérgio Moro admitiu em artigo escrito em 2004, só precisa ter clareza sobre um aspecto. Além de procurar, assumidamente, a “deslegitimação” do sistema político — o que também se busca no Brasil — a Mãos Limpas inaugurou um período de empobrecimento e recessão na economia. Foi assim que destruiu um sistema que garantiu o mais prolongado regime democrático da Italia ao longo de sua história republicana, colocando em seu lugar um condomínio de partidos e lideranças frágeis e dóceis, ideais para serem alvo das maiores economias da União Européia e dos Estados Unidos. O saldo econômico da Mãos Limpas é uma tragédia. Como informa a Economist na edição de 31 de janeiro de 2015, o desempenho da Italia nos anos posteriores à Mãos Limpas foi pior até que o da Grécia, aquela que enfrentou uma recessão de 25% em cinco anos, no mesmo período: “em valores constantes, a economia italiana afundou nos primeiros 14 anos do século (mesmo o PIB da Grécia é maior hoje do que era em 1999). ” No Brasil de 2015, a multa de R$ 4,47 bilhões pode abrir processo destrutivo de longa duração e consequências nocivas para o conjunto do país. Deposto em 1 de abril de 1964, João Goulart deixou o país convencido de que logo voltaria à presidência. Já uma parcela respeitável de seus adversários, na base social do golpe militar, tinha certeza de que a ditadura estava programada para durar um ano. Foram vinte anos. A leitura de outros relatos históricos mostra que esta dificuldade está longe de ser uma peculiaridade brasileira. Na maior parte da Segunda Guerra Mundial, o Partido Comunista Frances desempenhou um papel reconhecido na resistência ao nazismo. Nem sempre foi assim, porém. Você já sabe que nas ultimas semanas, no Rio Grande do Sul, 7 000 empregos ligados a Petrobras já foram eliminados, em empresas que acusam um rombo de R$ 5 bilhões nos pagamentos a receber. Este é o sinal de alerta para a judicialização da economia. Do total cobrado pelo Ministério Público, a maior parcela — R$ 3,1 bilhões — encontra-se na categoria sempre subjetiva dos “danos morais,” envolvendo dez vezes o valor estimado das propinas, o que não é comum. Repetindo um mantra que os brasileiros ouviram até enjoar durante a AP 470, os procuradores da Lava Jato falam em “punição exemplar”. Exemplo de que mesmo? O que se busca é esconder medidas jurídicas que colocam em risco o emprego dos brasileiros, seu salário, o futuro de suas famílias. Para começar, falta provar que todas as denúncias contra essas empresas são verdadeiras e podem ser demonstradas a partir de provas robustas. Quem sabe? Na página 36 da denuncia contra a OAS, por exemplo, chamada a pagar uma multa de R$ 988 milhões pelo pagamento de propinas, admite-se singelamente que “as transações bancárias até o momento não identificaram o montante de 1% nos contratos firmados entre a construtora e a Petrobras.” Na página 8, cita-se uma delação premiada, produto das circunstâncias que todos conhecemos, que afirma que “todos sabiam” do pagamento de um “porcentual” ao Partido dos Trabalhadores. Em outro cúmulo se precisão, se diz: “o que se rezava dentro da companhia é que esse valor seria integral para o PT.” A questão política e jurídica, na verdade, é outra. Consiste em perguntar quem deve pagar a conta. Teve razão a presidente Dilma Rousseff ao lembrar, ontem, que o país estaria muito melhor se as denuncias que envolvem a Petrobras tivessem sido investigadas há quase 20 anos, quando o gerente Pedro Barusco começou a montar um esquema na empresa. Há exatamente 18 anos, durante primeiro mandato de FHC, o Brasil inteiro tomou conhecimento de uma denúncia do jornalista Paulo Francis de que havia um esquema de propina na Petrobras, pela qual diversos diretores mantinham contas de 50 e 60 milhões de dólares em contas secretas na Suiça. Francis repetiu a denúncia mais de uma vez, pela TV. Em 1996, quando Paulo Francis fez a denuncia, Ministério Público já havia conquistado a autonomia de investigação garantida pela Constituição de 1988. Fez alguma coisa? E a Polícia Federal? Aprende-se, mais uma vez, uma boa e velha lição: a primeira medida para se impor medidas que prejudicam o conjunto da população e comprometem o destino do país é apagar sua memória. Deu para entender, certo? Artigo publicado originalmente em http://paulomoreiraleite.com/2015/02/21/caminho-terrorismo-economico/
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