A vez dos amigos do povo por Saul Leblon |
Dando o que Falar | |||
Dom, 29 de Dezembro de 2013 20:45 | |||
O conservadorismo brasileiro percorreu todo um alfabeto de alternativas ao longo de 2013 até se convencer de que, isoladamente, nenhuma das vogais ou consoantes lhe daria o que procura. O caminho da volta ao poder. A rua emerge como a derradeira aposta de quem, sucessivamente, ancorou o seu futuro no julgamento da AP 470, na explosão da inflação, no apagão das hidrelétricas, no abismo fiscal e, ainda há pouco, na hecatombe decorrente da redução da liquidez nos EUA. Cada uma dessas alternativas, mesmo sem deixar de impor constrangimentos objetivos ao país e ao governo, mostrou-se incapaz de destruir o contrapeso de acertos e conquistas acumulados ao longo dos últimos 12 anos. A irrupção de protestos em plena Copa do mundo tornou-se assim a nova bala de prata acalentada por aqueles que, corretamente, ressentem-se de um amalgama capaz de injetar torque e dinamismo ao acerto de contas que buscam com a agenda progressista brasileira.
O que se desenha para 2014 está mais próximo de um 2002 radicalizado, do que daquilo que se assistiu nas disputas de 2006 e 2010. Mobilizações de massa não são a primeira escolha de elites mais afeitas a golpes e arranjos de cúpula. Seu medo atávico às ruas remonta às revoluções burguesas do século XVIII, sendo a contrarrevolução francesa um exemplo clássico do empenho em resgatar o poder para a segurança de um diretório armado, se preciso. As reticências empalidecem, no entanto, em momentos da história em que a rua é o que de mais palpável se apresenta à regeneração de um domínio conservador espremido em uma correlação de forças que ameaça escapar ao seu controle. Hoje, não por acaso, o chão firme desses interesses no país se equilibra em duas hipertrofias insustentáveis: a do judiciário e a da mídia. A campanha do PT em 2014 não pode hesitar diante dessa mistura de esgotamento e desespero. Se o conservadorismo se inclina às ruas , a resposta progressista não pode ser a defesa retrógada de instituições ultrapassadas pelo avanço da sociedade.
Se eles convocam as ruas é porque o extraordinário bate à porta. E quando o extraordinário acontece não bastam as receitas da rotina. Artigo publicado originalmente em http://www.cartamaior.com.br/?/Editorial/A-vez-dos-amigos-do-povo/29887
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