A guerra contra a copa por Paulo Moreira Leite |
Dando o que Falar | |||
Seg, 26 de Maio de 2014 02:58 | |||
Na medida em que dados concretos começam a ser divulgados, começa a ficar claro que a guerra contra a Copa é expressão de um delírio conservador que recebe, acessoriamente, o apoio ruidoso de uma retórica de ultra-esquerda – bastante comum em situações políticas como a atual. Alguns números. A sugestão de que os estádios de futebol tiveram reajustes e sobrepreços excessivos não resiste a uma matemática contábil. A inflação acumulada do país, no período, chegou a 40%. A alta média dos estádios ficou em 36%. Num país que convive com metas inflacionárias como política oficial, reajustes desse tipo são parte natural da paisagem dos investimentos públicos e privados. Imaginar que o futebol retirou dinheiro da Educação é um acinte. Entre 2007, quando o país foi confirmado como sede da Copa,e o ano passado, os gastos do MEC com educação sugiram mais do que o dobro, em valores deflacionados. Como algumas pessoas podem ficar em dúvida diante destes números, que contrariam tudo o que se disse e se ouviu nos últimos meses, aqui vão os dados completos, ano a ano: em 2007, o gasto foi de R$ 50,2 bilhões; em 2008, ocorreu um crescimento superior a 10%, e as verbas passaram para R$ 56,4; em 2009, houve uma alta ainda maior, para R$ 67,1; em 2010, o salto, de quase 15%, levou para R$ 78,3; em 2011, foi para R$ 87,5; em 2012, para R$ 100,5. em 2013 chegou a R$ 107,00. Os gastos totais com a Copa, somando empréstimos públicos, privados, investimentos estaduais e municipais, chegam a R$ 26,7 bilhões. Não é pouco dinheiro, convenhamos. Mas é menos, por exemplo, que metade do patrimonio da família Marinho, dona da TV Globo, segundo a revista Forbes. Em outra conta: num país com PIB de R$ 4,5 trilhões, os R$ 26 bi continuam sendo um bom dinheiro mas não vamos perder a perspectiva dos números. Agora, algumas ideias. É claro que toda pessoa tem direito de ser contra a realização da Copa no Brasil. Em 2007 levantei críticas neste espaço – como qualquer pessoa, interessada na arqueologia da internet, poderá comprovar. Sete anos depois, essa discussão está fora de lugar. Depois da crise de 2008, a maior do capitalismo mundial em 85 anos, não é possível ignorar o lugar da Copa no estimulo a investimentos realizados no país. Os trabalhos da Copa garantem um acréscimo anual de 0,4% no PIB brasileiro. Também ajudam a criar 3,6 milhões de empregos. Talvez não seja a melhor saída. Nem a mais duradoura. Mas cabe lembrar que, sem alternativas, que jamais foram apresentadas, as pessoas não tem o que comer nem o que vestir, não é mesmo? Do ponto de vista dessas pessoas, a Copa já é uma vitória, ainda que parcial, beneficiando a população mais pobre. Ou desemprego no orçamento dos outros não arde? Além de sugerir medidas de austeridade, que afundaram a Europa, alguém apareceu com ideias mais adequadas, socialmente aceitáveis? A campanha contra a Copa é antiga. Se você fizer a arqueologia de seus críticos, irá encontrar declarações solenes de que o governo brasileiro deveria render-se definitivamente a supostas mediocridades nacionais e devolver a Copa para a FIFA. O argumento, na época, é que nem os estádios ficariam prontos. Sem comentários, não é mesmo? O debate seguinte foi outro. Nossos dinossauros se tornaram sociais – e foi para isso que a aliança com porta-vozes de uma retórica de ultra-esquerda se tornou necessária. Repare: a mesma turma que em 2007 – o ano em que o Brasil foi escolhido como país-sede --derrubou a CPMF, aquele imposto semi-invisível que garantia verbas para a saúde pública, resolveu pedir dinheiro para postos de saúde como argumento para combater a Copa. Sem ruborizar, teve a mesma reação diante do programa Mais Médicos. A tecnologia política é conhecida. Depois de negar recursos que poderiam, de forma consistente e duradoura, promover uma mudança real na saúde pública, vamos à rua pedir hospitais padrão-FIFA. Com todo respeito pela população que dá duro na fila dos hospitais públicos – e também pelos que são ludibriados regularmente pelos planos privados – cabe perguntar: quem queremos enganar com isso? Quem está falando de indignação real? Quem joga na hipocrisia total? A resposta virá em outubro. Até lá, o que se quer é enganar o eleitor. Artigo publicado originalmente em http://www.istoe.com.br/colunas-e-blogs/coluna/364861_A+GUERRA+CONTRA+A+COPA#.U4Hy_f4DqAs.facebook
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